«O lugar onde fui sem projecto nem mapa
O lugar fixo de morrer e renovar
O lugar onde sou nem sombra nem um nome
O lugar que abandono o lugar onde acordo
O lugar onde a vida aguarda um novo vinho
O lugar onde a pedra é todo o meu abrigo
O lugar de tão velho extremamente nítido
O lugar de tão frio no seu estar comigo
O lugar amplidão de todos os lugares
O lugar onde sou de todos os passados
O lugar de embarcar em barcos de papel
O lugar da conquista das cavernas do vento
O lugar de ser triste e esperar o infinito
O lugar de sorrir da viagem no início
O lugar da cisterna o lugar da latada
O lugar da debulha de tanta inútil lágrima
O lugar onde sou de raízes queimadas
Esquecimento só de todos os lugares.»
"E um dia os homens descobrirão que esses discos voadores estavam apenas estudando as vidas dos insectos..." Mário Quintana
segunda-feira, julho 30, 2007
Lugar
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José Martins Garcia
domingo, julho 29, 2007
Férias
Vou de férias.
Vou passando por aqui se para tanto me ajudar a vodafone.
Entretanto, boas férias ou bom trabalho, conforme os casos.
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Santo Amaro do Pico
quarta-feira, julho 25, 2007
terça-feira, julho 24, 2007
segunda-feira, julho 23, 2007
domingo, julho 22, 2007
Crónica de Ar(riscar)
Nas ruas, as árvores recolhem as folhas, porque na passagem do dias, os riscos apontam bolas enormes, traçadas por compassos em folhas de papel, aonde, dizem os que sabem, que por exigência do Real, as vagas vão, lentamente, aumentando ou diminuindo o tamanho do medo. Nas janelas das vizinhas, enquanto umas esperam desgraça, outras riem de alegria e algumas, as de lenço vermelho na cabeça, sorriem. É a divisão do riso ao sorriso. Um risco. Temos disto por aí. Riscos de pessoas com narizes desapontados e olhos doces; dedos mindinhos grandes inclinados no ângulo de outros olhos tristes e sós, enquanto, num canto qualquer, a tabuada vai insistindo no gerúndio de um jogo de cartas batoteiro. O jogador cofia o bigode basto em riscos de pó. Tem riscos nos olhos; mãos riscadas de tinta e um ar de quem, por desporto, gosta de correr riscos. Sorte dele. Azar no jogo.
Há qualquer coisa riscada na corrente do mar. As crianças agora que, já é Verão, chegam à praia de cabelos riscados a meio e se a mãe está presente não há riscos para correr, mas há riscos nas mochilas que, acabado o ano lectivo, servem para transportar maçãs, sumos e bolachas; mais os óculos de sol e o mp3. Com sorte, um livro para ler nas férias e, na areia, um Castelo com conchas no lugar das janelas e pedrinhas brancas a fazer de conta que os anos nunca ultrapassaram o encanto ou se sobrepuseram a ele.
Falta traçar o risco debaixo, o do convés. Não risques o chão com esses sapatos. Não risques o vidro. Risca. Apaga. Lava. (Corro o risco de não acabar isto). Linhas, agrafos. Os riscos que as borboletas fazem quando passam rente aos cabelos. Risca a folha. Risca essa palavra. Esta palavra tem risco?
No céu, quando é de noite e sonhamos que, por magia, nos podemos abstrair e morrer por minutos, as gaivotas riscam tudo o que alcançam, como se viesse alguém, apagar aquela luz e é, então, que a lua aparece e as estrelas brilham, porque arriscam.
Escreve-se com riscos endireitados no papel como composições de sons. É, talvez por isso, que as letras são todas diferentes e que, por exemplo, o [o] é um risco enrolado e gordo e o [s] uma linha dobrada e ziguezagueante, como se dançasse e dentro tivesse uma força qualquer teimosa e insistente que, às vezes, mas só mesmo às vezes, nos pode impedir de voar. Os riscos de não tocar com os pés no chão não são sempre maus. São como os riscos do [v]. São de atirar para cima e esperar que voem.
(Correio do Norte, 2ª quinzena de Julho)
Há qualquer coisa riscada na corrente do mar. As crianças agora que, já é Verão, chegam à praia de cabelos riscados a meio e se a mãe está presente não há riscos para correr, mas há riscos nas mochilas que, acabado o ano lectivo, servem para transportar maçãs, sumos e bolachas; mais os óculos de sol e o mp3. Com sorte, um livro para ler nas férias e, na areia, um Castelo com conchas no lugar das janelas e pedrinhas brancas a fazer de conta que os anos nunca ultrapassaram o encanto ou se sobrepuseram a ele.
Falta traçar o risco debaixo, o do convés. Não risques o chão com esses sapatos. Não risques o vidro. Risca. Apaga. Lava. (Corro o risco de não acabar isto). Linhas, agrafos. Os riscos que as borboletas fazem quando passam rente aos cabelos. Risca a folha. Risca essa palavra. Esta palavra tem risco?
No céu, quando é de noite e sonhamos que, por magia, nos podemos abstrair e morrer por minutos, as gaivotas riscam tudo o que alcançam, como se viesse alguém, apagar aquela luz e é, então, que a lua aparece e as estrelas brilham, porque arriscam.
Escreve-se com riscos endireitados no papel como composições de sons. É, talvez por isso, que as letras são todas diferentes e que, por exemplo, o [o] é um risco enrolado e gordo e o [s] uma linha dobrada e ziguezagueante, como se dançasse e dentro tivesse uma força qualquer teimosa e insistente que, às vezes, mas só mesmo às vezes, nos pode impedir de voar. Os riscos de não tocar com os pés no chão não são sempre maus. São como os riscos do [v]. São de atirar para cima e esperar que voem.
(Correio do Norte, 2ª quinzena de Julho)
Mulher bonita não tem que pedir adoçante…
Ela entrou no café e pausou na entrada. Ficou o momento necessário para que quem quisesse a olhasse a contra luz do sol de verão. Levou a mão ao cabelo, como quem dá ordem de arranque e entrou, agora sim, no pequeno café do cais. Trazia um daqueles vestidos, tipo Zara, com grandes prints a amarelos e branco. Aquela espécie de vestido que, quando de pé, parece de tamanho quase normal, mas quando sentadas lhes sobe pela perna acima, até níveis “indescritíveis”, mas controláveis com o cruzar das pernas. Ela sentou-se e cruzou as pernas de forma a deixar o vestido atingir cerca de 75% da capacidade Zara. Não era brejeira. Tirou os óculos como uma actriz de cinema, pela frente, deslizando-os pelo nariz abaixo. Ajeitou ligeiramente o cabelo para trás, no caso de haver alguém que quisesse ver melhor, e pediu um café e um copo de água à rapariga do café do cais.
Era do tipo de mulher que sofre de um terrível predicamento, era quase, quase bonita. Aquele tipo de mulher que, não o sendo, pensa que é, e espera ser tratada como pensa que deve ser tratada uma mulher bonita.
Percebendo que o café não seria servido de imediato, acendeu um cigarro. Ela sabe que, mesmo não sendo, ou quase sendo, uma mulher bonita não pára, não se abandona ao nada, existe a todo o momento. Ela esforça-se. Debruçou-se sobre os cotovelos. Retirou, com a ponta das unhas pintadas, de uma forma ligeiramente sensual, algo da ponta da língua. Uma nica de tabaco, talvez. Sugou no cigarro de uma forma que eu sei que tu sabes que eu sei que tu sabes, e controlou o tempo.
A rapariga do café do cais depositou na sua pequena mesa um café e um copo de água. Ela olhou para o café com tal concentração e espanto, de uma forma despropositada. Olhou, de imediato, para a rapariga do café do cais com raiva nos olhos. Desviou o olhar e sem a tornar a olhar levantou o pacote de açúcar, devolveu-o à rapariga do café do cais e cuspiu – É adoçante, se faz favor! –.
As suas nádegas nunca mais descansaram em uníssono naquela cadeira do café do cais, as pernas cruzaram e descruzaram, o vestido subiu e desceu sem plano nem cuidados e o cigarro foi esmagado como um insecto que magoa. A beata ficou erecta, com a marca de batom na ponta e uma fina coluna de fumo a fugir do cinzeiro. Mal lhe foi apresentado o pacote de adoçante ela arrancou-o da mão da rapariga do café do cais, rasgou o pacote com as unhas como se fosse uma prostituta que abre um preservativo que não lhe vai dar prazer, despejou o adoçante como quem despeja veneno no cálice do condenado, e engoliu o café escaldante como quem toma uma sentença. Ignorou a pureza do copo de água. Levantou-se, deixou umas moedas, as necessárias, e saiu sem encore. Era óbvio que aqui não fora tomada por mulher bonita.
Era do tipo de mulher que sofre de um terrível predicamento, era quase, quase bonita. Aquele tipo de mulher que, não o sendo, pensa que é, e espera ser tratada como pensa que deve ser tratada uma mulher bonita.
Percebendo que o café não seria servido de imediato, acendeu um cigarro. Ela sabe que, mesmo não sendo, ou quase sendo, uma mulher bonita não pára, não se abandona ao nada, existe a todo o momento. Ela esforça-se. Debruçou-se sobre os cotovelos. Retirou, com a ponta das unhas pintadas, de uma forma ligeiramente sensual, algo da ponta da língua. Uma nica de tabaco, talvez. Sugou no cigarro de uma forma que eu sei que tu sabes que eu sei que tu sabes, e controlou o tempo.
A rapariga do café do cais depositou na sua pequena mesa um café e um copo de água. Ela olhou para o café com tal concentração e espanto, de uma forma despropositada. Olhou, de imediato, para a rapariga do café do cais com raiva nos olhos. Desviou o olhar e sem a tornar a olhar levantou o pacote de açúcar, devolveu-o à rapariga do café do cais e cuspiu – É adoçante, se faz favor! –.
As suas nádegas nunca mais descansaram em uníssono naquela cadeira do café do cais, as pernas cruzaram e descruzaram, o vestido subiu e desceu sem plano nem cuidados e o cigarro foi esmagado como um insecto que magoa. A beata ficou erecta, com a marca de batom na ponta e uma fina coluna de fumo a fugir do cinzeiro. Mal lhe foi apresentado o pacote de adoçante ela arrancou-o da mão da rapariga do café do cais, rasgou o pacote com as unhas como se fosse uma prostituta que abre um preservativo que não lhe vai dar prazer, despejou o adoçante como quem despeja veneno no cálice do condenado, e engoliu o café escaldante como quem toma uma sentença. Ignorou a pureza do copo de água. Levantou-se, deixou umas moedas, as necessárias, e saiu sem encore. Era óbvio que aqui não fora tomada por mulher bonita.
sábado, julho 21, 2007
sexta-feira, julho 20, 2007
Os meus lençóis
Noites passaram em que a nossa cama foi um mar de lençóis,
Aonde, de uma oriental praia açoriana, muitos mares nós navegamos.
Tempestades os encheram, tristezas os ensoparam,
Luas os pratearam e sois do seu seio nasceram.
Deles me ergui Adamastor e neles mergulhei naufrago
E afogado, ao ritmo das ondas, com teu corpo dancei e lutei.
Lençóis revoltos sobre colchão sagrado, seu sal suor do nosso amar.
Neles durmo, quando não contigo, com os poetas da pátria que já foi minha mãe.
Aonde, de uma oriental praia açoriana, muitos mares nós navegamos.
Tempestades os encheram, tristezas os ensoparam,
Luas os pratearam e sois do seu seio nasceram.
Deles me ergui Adamastor e neles mergulhei naufrago
E afogado, ao ritmo das ondas, com teu corpo dancei e lutei.
Lençóis revoltos sobre colchão sagrado, seu sal suor do nosso amar.
Neles durmo, quando não contigo, com os poetas da pátria que já foi minha mãe.
quinta-feira, julho 19, 2007
Ortofrenia
"Bóia", Julho de 2007
«Aclamações
dentro do edifício inexpugnável
aclamações
por já termos chapéu para a solidão
aclamações
por sabermos estar vivos na geleira
aclamações
por ardermos mansinho junto ao mar
aclamações
porque cessou enfim o ruído da noite a secreta alegria por escadas de caracol
aclamações
porque uma coisa é certa: ninguém nos ouve
porque outra é indubitável: não se ouve ninguém.»
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Mário Cesariny
terça-feira, julho 17, 2007
Ali e aqui
A teia familiar cria laços que a razão conhece mas não explica. Não fui a S. Miguel, onde tenho toda a minha família directa, durante quase dois meses. Mesmo sem ter mulher nem filhos, tenho na minha família, em S. Miguel, cerca de duas dezenas das pessoas mais importantes da minha vida.
O membro mais pequeno deste clã é o Tiago que tem três anos. Quando cheguei, por volta das cinco da tarde, decidi ir ter com a sobrinhada que estava a sair do Colégio São Francisco Xavier. Lá fui, de recreio em recreio, de sala em sala, ajudar a recolher o rebanho. O último foi o Tiago, que estava na sala dos pequeninos. Cheguei, espreitei e fiquei a ver a bênção que é ser e ter uma criança.
Quando me viu, o Tiago, cerrou os punhos, encolheu os braços, pôs-se em pontinhas dos pés, deu para aí uns dois pulinhos e de sorriso na boca correu para me dar um pequeno grande abraço. Apertou-me o pescoço como quem aperta um homem inteiro. Depois, ainda abraçado por mim, pousou a sua pequena mão na minha grande cara e, banhado em felicidade, exclamou – Tio ToZé! Tu estavas ali e agora estás aqui?!?! – Do fundo do coração respondi, sem nada lhe dizer, – O tio ToZé está sempre aqui! -
O membro mais pequeno deste clã é o Tiago que tem três anos. Quando cheguei, por volta das cinco da tarde, decidi ir ter com a sobrinhada que estava a sair do Colégio São Francisco Xavier. Lá fui, de recreio em recreio, de sala em sala, ajudar a recolher o rebanho. O último foi o Tiago, que estava na sala dos pequeninos. Cheguei, espreitei e fiquei a ver a bênção que é ser e ter uma criança.
Quando me viu, o Tiago, cerrou os punhos, encolheu os braços, pôs-se em pontinhas dos pés, deu para aí uns dois pulinhos e de sorriso na boca correu para me dar um pequeno grande abraço. Apertou-me o pescoço como quem aperta um homem inteiro. Depois, ainda abraçado por mim, pousou a sua pequena mão na minha grande cara e, banhado em felicidade, exclamou – Tio ToZé! Tu estavas ali e agora estás aqui?!?! – Do fundo do coração respondi, sem nada lhe dizer, – O tio ToZé está sempre aqui! -
A minha cabeceira
A minha cabeceira, que já foi tua,
Tem os teus actos, mas não os teus sonhos,
Tem as tuas palavras, mas não o teu pensar,
Tem os teus olhos, mas não o teu ver,
Tem as tuas lágrimas, mas não a tua tristeza,
Tem os teus soluços, mas não a tua mágoa,
Tem o teu sorriso, mas não a tua felicidade,
Tem as tuas gargalhadas, mas não a tua alegria,
Tem os teu abraços, mas não a tua compaixão,
Tem os teus seios, mas não a tua maciez,
Tem as tuas ancas, mas não a tua paixão,
Tem a tua flor, mas não o teu amor,
Tem o teu ventre, mas não a tua vida,
A minha cabeceira, que já foi tua,
É minha, e tu não…
Tem os teus actos, mas não os teus sonhos,
Tem as tuas palavras, mas não o teu pensar,
Tem os teus olhos, mas não o teu ver,
Tem as tuas lágrimas, mas não a tua tristeza,
Tem os teus soluços, mas não a tua mágoa,
Tem o teu sorriso, mas não a tua felicidade,
Tem as tuas gargalhadas, mas não a tua alegria,
Tem os teu abraços, mas não a tua compaixão,
Tem os teus seios, mas não a tua maciez,
Tem as tuas ancas, mas não a tua paixão,
Tem a tua flor, mas não o teu amor,
Tem o teu ventre, mas não a tua vida,
A minha cabeceira, que já foi tua,
É minha, e tu não…
segunda-feira, julho 16, 2007
Carta da Infância
"Amigo Luar:
Estou fechado no quarto escuro
e tenho chorado muito.
Quando choro lá fora
ainda posso ver as lágrimas caírem na palma das
minhas mãos e brincar com elas ao orvalho
nas flores pela manhã.
Mas aqui é tudo por demais escuro
e eu nem sequer tenho duas estrelas nos meus olhos.
Lembro-me das noites em que me fazem deitar tão
cedo e te oiço bater, chamar e bater, na fresta
da minha janela.
Pelo muito que te tenho perdido enquanto durmo
vem agora,
no bico dos pés
para que eles te não sintam lá dentro,
brincar comigo aos presos no segredo
quando se abre a porta de ferro e a luz diz:
bons dias, amigo."
Carlos de Oliveira , Trabalho Poético, Lisboa, Sá da Costa, 1998 (3ª ed.)
domingo, julho 15, 2007
sábado, julho 14, 2007
sexta-feira, julho 13, 2007
No comments
Pope reasserts salvation comes from one church
By Nicole Winfield, Associated Press July 11, 2007
LORENZAGO DI CADORE, Italy
-- Pope Benedict XVI reasserted the primacy of the Roman Catholic Church, approving a document released yesterday that says other Christian communities are either defective or not true churches and Catholicism provides the only true path to salvation.
http://www.boston.com/news/world/europe/articles/2007/07/11/pope_reasserts_salvation_comes_from_one_church/
By Nicole Winfield, Associated Press July 11, 2007
LORENZAGO DI CADORE, Italy
-- Pope Benedict XVI reasserted the primacy of the Roman Catholic Church, approving a document released yesterday that says other Christian communities are either defective or not true churches and Catholicism provides the only true path to salvation.
http://www.boston.com/news/world/europe/articles/2007/07/11/pope_reasserts_salvation_comes_from_one_church/
quinta-feira, julho 12, 2007
Touradas
O fim de semana passado houve tourada de praça, aqui, em S. Jorge. Não fui, mas gostava de ter ido, pelo menos uma vez pela diversidade cultural.
Em honra do touro trancrevo um excerto de uma obra prima da literatura portuguesa.
"Fez um esforço.
Embora ardesse numa chama de fúria, tentou refrear os nervos e medir com a calma possível a situação.
Estava, pois, encurralado, impedido de dar um passo, à espera de que lhe chegasse a vez!
Um ser livre e natural, um toiro nado e criado na lezíria ribatejana, de gaiola como um passarinho, condenado a divertir a multidão!
Irreprimível, uma onda de calor tapou-lhe o entendimento por um segundo.
O corpo, inchado de raiva, empurrou as paredes do cubículo, num desespero de Sansão.
Nada. Os muros eram resistentes, à prova de quanta força e quanta justa indignação pudesse haver.
Os homens, só assim: ou montados em cavalos velozes e defendidos por arame farpado, ou com sebes de cimento armado entre eles e a razão dos mais...
Palmas e música lá fora.
O Malhado dava gozo às senhorias...Um frémito de revolta arrepiou-lhe o pêlo.
Dali a nada, ele. Ele Miura, o rei da campina !
A multidão calou-se.
Começou a ouvir-se, sedante, nostálgico, o som grosso e pacífico das chocas.
A planície!...O descampado infinito, loiro de sol e trigo...
O ilimitado redil das noites luarentas, com bocas mudas, limpas, a ruminar o tempo...
A fornalha escaldante, sedenta, desesperante, que o estrídulo das cegarregas levava ao rubro.
Novamente o silêncio.
Depois, ao lado, passes incertos de quem entra vencido e humilhado no primeiro buraco...
Refrescou as ventas com a língua húmida e tentou regressar ao paraíso perdido.
A planície...
Um som fino de corneta.
Estremeceu.
Seria agora? Teria chegado, enfim, a sua vez?
Não chegara.
Foi a porta da esquerda que se abriu, e o rugido soturno que veio a seguir era do Bronco.Sem querer, cresceu outra vez quanto pôde para as paredes estreitas do cárcere. Mas a indignação e os músculos deram em pedra fria.
A planície... O bebedoiro da Terra-Velha, fresco, com água limpa a espelhar os olhos...
Assobios.
O Bronco não fazia bem o papel...Um toque estranho, triste, calou a praça e rarefez o curro.Rápida e vaga, a sombra do companheiro passou-lhe pela vista turva.
Apertou-se-lhe o coração.
Que seria?Palmas, música, gritos.Um largo espaço assim, com o mundo inteiro a vibrar para além da prisão.
Algum tempo depois, novamente o silêncio e novamente as notas lúgubres do clarim.Todo inteiro a escutar o dobre a finados, abrasado de não sabia que lume, Miura tentava em vão encontrar no instinto confuso o destino do amigo.
Subitamente, abriu-se-lhe sobre o dorso um alçapão, e uma ferroada fina, funda, entrou-lhe na carne viva.
Cerrou os dentes, e arqueou-se, num ímpeto.Desgraçadamente, não podia nada.
O senhor homem sabia bem quando e como as fazia. Mas por que razão o espetava daquela maneira?
Três pancadas secas na porta, um rumor de tranca que cede, uma fresta que se alargou, deram-lhe num relance a explicação do enigma da agressão: chegara a sua vez.
Nova picada no lombo.- Miura! Cornudo!
Dum salto todo muscular, quase de voo, estava na arena.
Pronto! A tremer como varas verdes, de cólera e de angústia, olhou à volta. Um tapume redondo e, do lado de lá, gente, gente, sem acabar.Com a pata nervosa escarvou a areia do chão.
Um calor de bosta macia correu-lhe pelo rego do servidoiro.
Urinou sem querer.
Gritos da multidão.
Que papel ia representar! Que se pedia do seu ódio? Hesitante, um tipo magro, doirado, entrou no redondel.
Olhou-o a frio. Que força traria no rosto mirrado, nas mãos amarelas, para se atrever assim a transpor a barreira?A figura franzina avançou.Admirado, Miura olhava aquela fragilidade de dois pés. Olhava-a sem pestanejar, olímpica e ansiosamente.Com ar de quem joga a vida, o manequim de lantejoulas caminhava sempre.
E, quando Miura o tinha já à distância dum arranco, e ainda sem compreender olhava um tal heroísmo, enfatuadamente, o outro bateu o pé direito no chão e gritou:-Eh! boi Eh! toiro!A multidão dava palmas.-Eh! boi Eh! toiro! Tinha de ser.
Já que desejavam tão ardentemente o fruto da sua fúria, hei-lo.
Mas o homem que visou, que atacou de frente, cheio de lealdade, inesperadamente transfigurou-se na confusão de uma nuvem vermelha, onde o ímpeto das hastes aguçadas se quebrou desiludido.Cego daquele ludíbrio, tornou a avançar.
E foi uma torrente de energia ofendida que se pôs em movimento.Infelizmente, o fantasma, que aparecia e desaparecia no mesmo instante, escondera-se covardemente de novo por detrás da mancha atordoadora. Os cornos ávidos, angustiados, deram em cor.
Mais palmas ao dançarino.
Parou. Assim nada o poderia salvar.
À suprema humilhação de estar ali, juntava-se o escárnio de andar a marrar em sombras.
Não. Era preciso ver calmamente.
Que a sua raiva atingisse ao menos o alvo.O espectro doirado lá estava sempre. Pequenino, com ar de troça, olhava-o como se olhasse um brinquedo inofensivo.Silêncio.Esperou.
O homem ia desafiá-lo certamente outra vez.Tal e qual. Inteiramente confiado, senhor de si, veio vindo, veio vindo até não poder sair do domínio dos chifres.
Agora!
De novo, porém, a nuvem vermelha apareceu. E de novo Miura gastou nela a explosão da sua dor.
Palmas, gritos.
Desesperado, tornou a escarvar o chão, agora com as patas e com os galhos. O homem!Mas o inimigo não desistia.
Talvez para exaltar a própria vaidade, aparentava dar-lhe mais oportunidades.
Lá vinha todo empertigado, a apontar dois pequenos paus coloridos, e a gritar como há pouco:- Eh! toiro! Eh! boi!Sem lhe dar tempo, com quanta alma pôde, lançou-se-lhe à figura, disposto a tudo. Não trouxesse ele o pano mágico, e veríamos!Não trazia.
E, por isso, quando se encontraram e o outro lhe pregou no cachaço, fundas, dolorosas, as duas farpas que erguia nas mãos, tinha-lhe o corno direito enterrado na fundura da barriga mole.
Gritos e relâmpagos escarlates de todos os lados.Passada a bruma que se lhe fez nos olhos relanceou a vista pela plateia.
Então?!
Como não recebeu qualquer resposta, desceu solitário à consciência do seu martírio.
Lá levavam o moribundo em braços, e lá saltava na arena outro farsante doirado.Esperou. Se vinha sem a capa enfeitiçada, sem o diabólico farrapo que o cegava e lhe perturbava o entendimento, morria. Mas o outro estava escudado.
Apesar disso, avançou.
Avançou e bateu, como sempre, em algodão.Voltou à carga.O corpo fino do toureiro, porém, fugia-lhe por artes infernais.
Protestos da assistência.
Avançou de novo. Os olhos já lhe doíam e a cabeça já lhe andava à roda.Humilhado, com o sangue a ferver-lhe nas veias, escarvou a areia mais uma vez, urinou e roncou, num sofrimento sem limites.
Miura, joguete nas mãos dum Zé-Ninguém!
Num ímpeto, sem dar tempo ao inimigo, caíu sobre ele. Mas quê! Como um gamo, o miserável saltava a vedação.Desesperado, espetou os chifres na tábua dura, em direcção à barriga do fugitivo, que arquejava ainda do outro lado.
Sangue e suor corriam-lhe pelo lombo abaixo.Ouviu uma voz que o chamava. Quem seria? Voltou-se. Mas era um novo palhaço, que trazia também a nuvem, agora pequena e triangular.
Mesmo assim, quase sem tino e a saber que era em vão que avançava, avançou.Deu, como sempre na miragem enganadora.Renovou a investida. Iludido, outra vez.Parou. Mas não acabaria aquele martírio?
Não haveria remédio para semelhante mortificação?Num último esforço, avançou quatro vezes. Nada. Apenas palmas ao actor.Quando? Quando chegaria o fim de semelhante tormento?
Subitamente, o adversário estendeu-lhe diante dos olhos congestionados o brilho frio dum estoque.Quê?! Pois poderia morrer ali, no próprio sítio da sua humilhação?! Os homens tinham dessas generosidades?!
Calada, a lâmina oferecia-se inteira.Calmamente, num domínio perfeito de si, Miura fitou-a bem.
Depois, numa arremetida que parecia ainda de luta e era de submissão, entregou o pescoço vencido ao alívio daquele gume.
"Miguel Torga, «Bichos». Coimbra, Ed. Autor, 1940; 18.ª ed. 1990.
Em honra do touro trancrevo um excerto de uma obra prima da literatura portuguesa.
"Fez um esforço.
Embora ardesse numa chama de fúria, tentou refrear os nervos e medir com a calma possível a situação.
Estava, pois, encurralado, impedido de dar um passo, à espera de que lhe chegasse a vez!
Um ser livre e natural, um toiro nado e criado na lezíria ribatejana, de gaiola como um passarinho, condenado a divertir a multidão!
Irreprimível, uma onda de calor tapou-lhe o entendimento por um segundo.
O corpo, inchado de raiva, empurrou as paredes do cubículo, num desespero de Sansão.
Nada. Os muros eram resistentes, à prova de quanta força e quanta justa indignação pudesse haver.
Os homens, só assim: ou montados em cavalos velozes e defendidos por arame farpado, ou com sebes de cimento armado entre eles e a razão dos mais...
Palmas e música lá fora.
O Malhado dava gozo às senhorias...Um frémito de revolta arrepiou-lhe o pêlo.
Dali a nada, ele. Ele Miura, o rei da campina !
A multidão calou-se.
Começou a ouvir-se, sedante, nostálgico, o som grosso e pacífico das chocas.
A planície!...O descampado infinito, loiro de sol e trigo...
O ilimitado redil das noites luarentas, com bocas mudas, limpas, a ruminar o tempo...
A fornalha escaldante, sedenta, desesperante, que o estrídulo das cegarregas levava ao rubro.
Novamente o silêncio.
Depois, ao lado, passes incertos de quem entra vencido e humilhado no primeiro buraco...
Refrescou as ventas com a língua húmida e tentou regressar ao paraíso perdido.
A planície...
Um som fino de corneta.
Estremeceu.
Seria agora? Teria chegado, enfim, a sua vez?
Não chegara.
Foi a porta da esquerda que se abriu, e o rugido soturno que veio a seguir era do Bronco.Sem querer, cresceu outra vez quanto pôde para as paredes estreitas do cárcere. Mas a indignação e os músculos deram em pedra fria.
A planície... O bebedoiro da Terra-Velha, fresco, com água limpa a espelhar os olhos...
Assobios.
O Bronco não fazia bem o papel...Um toque estranho, triste, calou a praça e rarefez o curro.Rápida e vaga, a sombra do companheiro passou-lhe pela vista turva.
Apertou-se-lhe o coração.
Que seria?Palmas, música, gritos.Um largo espaço assim, com o mundo inteiro a vibrar para além da prisão.
Algum tempo depois, novamente o silêncio e novamente as notas lúgubres do clarim.Todo inteiro a escutar o dobre a finados, abrasado de não sabia que lume, Miura tentava em vão encontrar no instinto confuso o destino do amigo.
Subitamente, abriu-se-lhe sobre o dorso um alçapão, e uma ferroada fina, funda, entrou-lhe na carne viva.
Cerrou os dentes, e arqueou-se, num ímpeto.Desgraçadamente, não podia nada.
O senhor homem sabia bem quando e como as fazia. Mas por que razão o espetava daquela maneira?
Três pancadas secas na porta, um rumor de tranca que cede, uma fresta que se alargou, deram-lhe num relance a explicação do enigma da agressão: chegara a sua vez.
Nova picada no lombo.- Miura! Cornudo!
Dum salto todo muscular, quase de voo, estava na arena.
Pronto! A tremer como varas verdes, de cólera e de angústia, olhou à volta. Um tapume redondo e, do lado de lá, gente, gente, sem acabar.Com a pata nervosa escarvou a areia do chão.
Um calor de bosta macia correu-lhe pelo rego do servidoiro.
Urinou sem querer.
Gritos da multidão.
Que papel ia representar! Que se pedia do seu ódio? Hesitante, um tipo magro, doirado, entrou no redondel.
Olhou-o a frio. Que força traria no rosto mirrado, nas mãos amarelas, para se atrever assim a transpor a barreira?A figura franzina avançou.Admirado, Miura olhava aquela fragilidade de dois pés. Olhava-a sem pestanejar, olímpica e ansiosamente.Com ar de quem joga a vida, o manequim de lantejoulas caminhava sempre.
E, quando Miura o tinha já à distância dum arranco, e ainda sem compreender olhava um tal heroísmo, enfatuadamente, o outro bateu o pé direito no chão e gritou:-Eh! boi Eh! toiro!A multidão dava palmas.-Eh! boi Eh! toiro! Tinha de ser.
Já que desejavam tão ardentemente o fruto da sua fúria, hei-lo.
Mas o homem que visou, que atacou de frente, cheio de lealdade, inesperadamente transfigurou-se na confusão de uma nuvem vermelha, onde o ímpeto das hastes aguçadas se quebrou desiludido.Cego daquele ludíbrio, tornou a avançar.
E foi uma torrente de energia ofendida que se pôs em movimento.Infelizmente, o fantasma, que aparecia e desaparecia no mesmo instante, escondera-se covardemente de novo por detrás da mancha atordoadora. Os cornos ávidos, angustiados, deram em cor.
Mais palmas ao dançarino.
Parou. Assim nada o poderia salvar.
À suprema humilhação de estar ali, juntava-se o escárnio de andar a marrar em sombras.
Não. Era preciso ver calmamente.
Que a sua raiva atingisse ao menos o alvo.O espectro doirado lá estava sempre. Pequenino, com ar de troça, olhava-o como se olhasse um brinquedo inofensivo.Silêncio.Esperou.
O homem ia desafiá-lo certamente outra vez.Tal e qual. Inteiramente confiado, senhor de si, veio vindo, veio vindo até não poder sair do domínio dos chifres.
Agora!
De novo, porém, a nuvem vermelha apareceu. E de novo Miura gastou nela a explosão da sua dor.
Palmas, gritos.
Desesperado, tornou a escarvar o chão, agora com as patas e com os galhos. O homem!Mas o inimigo não desistia.
Talvez para exaltar a própria vaidade, aparentava dar-lhe mais oportunidades.
Lá vinha todo empertigado, a apontar dois pequenos paus coloridos, e a gritar como há pouco:- Eh! toiro! Eh! boi!Sem lhe dar tempo, com quanta alma pôde, lançou-se-lhe à figura, disposto a tudo. Não trouxesse ele o pano mágico, e veríamos!Não trazia.
E, por isso, quando se encontraram e o outro lhe pregou no cachaço, fundas, dolorosas, as duas farpas que erguia nas mãos, tinha-lhe o corno direito enterrado na fundura da barriga mole.
Gritos e relâmpagos escarlates de todos os lados.Passada a bruma que se lhe fez nos olhos relanceou a vista pela plateia.
Então?!
Como não recebeu qualquer resposta, desceu solitário à consciência do seu martírio.
Lá levavam o moribundo em braços, e lá saltava na arena outro farsante doirado.Esperou. Se vinha sem a capa enfeitiçada, sem o diabólico farrapo que o cegava e lhe perturbava o entendimento, morria. Mas o outro estava escudado.
Apesar disso, avançou.
Avançou e bateu, como sempre, em algodão.Voltou à carga.O corpo fino do toureiro, porém, fugia-lhe por artes infernais.
Protestos da assistência.
Avançou de novo. Os olhos já lhe doíam e a cabeça já lhe andava à roda.Humilhado, com o sangue a ferver-lhe nas veias, escarvou a areia mais uma vez, urinou e roncou, num sofrimento sem limites.
Miura, joguete nas mãos dum Zé-Ninguém!
Num ímpeto, sem dar tempo ao inimigo, caíu sobre ele. Mas quê! Como um gamo, o miserável saltava a vedação.Desesperado, espetou os chifres na tábua dura, em direcção à barriga do fugitivo, que arquejava ainda do outro lado.
Sangue e suor corriam-lhe pelo lombo abaixo.Ouviu uma voz que o chamava. Quem seria? Voltou-se. Mas era um novo palhaço, que trazia também a nuvem, agora pequena e triangular.
Mesmo assim, quase sem tino e a saber que era em vão que avançava, avançou.Deu, como sempre na miragem enganadora.Renovou a investida. Iludido, outra vez.Parou. Mas não acabaria aquele martírio?
Não haveria remédio para semelhante mortificação?Num último esforço, avançou quatro vezes. Nada. Apenas palmas ao actor.Quando? Quando chegaria o fim de semelhante tormento?
Subitamente, o adversário estendeu-lhe diante dos olhos congestionados o brilho frio dum estoque.Quê?! Pois poderia morrer ali, no próprio sítio da sua humilhação?! Os homens tinham dessas generosidades?!
Calada, a lâmina oferecia-se inteira.Calmamente, num domínio perfeito de si, Miura fitou-a bem.
Depois, numa arremetida que parecia ainda de luta e era de submissão, entregou o pescoço vencido ao alívio daquele gume.
"Miguel Torga, «Bichos». Coimbra, Ed. Autor, 1940; 18.ª ed. 1990.
segunda-feira, julho 09, 2007
Dedicatória II
Não imaginas o frio que sentimos, quando os pés de sempre deixam de passear nas nossas casas e as mãos desaparecem dos acenos quotidianos. Arde quase tudo, até a boca quando falamos. Sal, água e aquele desassossego interior que parece querer embrulhar-se para sempre no coração; tal e qual como o boné xadrez que não demos a ninguém e deixámos ficar enrolado na manta do sofá, que é azul e cheira a Lavanda, acabada de por.
7 Maravilhas do Mundo
Tenho a evidenciar duas. A primeira, foi a única candidata a ser vaiada pelas milhares de criaturas presentes, a Estátua da Liberdade. Algo não vai bem quando um icon que representa o melhor da América é vaiado por um público ocidental programado para aplaudir tudo o que mexe, do tio Patinhas, ao Che Guevara. Eu sei, a Estátua da Liberdade não mexe e, nos E.U.A., a Liberdade transformou-se numa estátua.
A segunda, foi de longe a mais aplaudida, Jennifer Lopez. Maravilhosa.
A segunda, foi de longe a mais aplaudida, Jennifer Lopez. Maravilhosa.
Dedicatória I
Nas ilhas, o lugar de ser fica à beira mar como num complemento circunstancial de modo, para onde, sem querer, está o corpo inclinado a balançar e a enterrar(-se). E o coração dos ilhéus tem actos como nas peças de Teatro; capítulos como os Romances e versos como um Poema de palavras reticentes, entre vírgulas, ou, tão somente, atravessadas por um hífen de ligação, justamente posto ou aglutinado, como o senhor velho, de pouco cabelo e cheio de barcos nos olhos, que atravessa, velozmente, as linhas deste texto, entre parêntes(es) ou à boleia de um atributo, que me dá honras de poder vê-lo.
domingo, julho 08, 2007
sábado, julho 07, 2007
Viva!!!
"(...) Na prática, o discurso da açorianidade traduz-se num processo contínuo de apropriação, difusão e circulação de símbolos, idéias e emblemas capazes de fazer operar centenas de organizações em torno de uma “comunidade de sentimentos”(APPADURAI, 1996: 8; ALMEIDA, 2001:162) que tem os Açores como raiz e
centro simbólico e suas terminações localizadas nas expressões populares locais, quer das ilhas, quer das comunidades da diáspora. Estas expressões culturais são os objetos típicos de sua demonstração, como as festas do Espírito Santo, touradas, danças camponesas, língua e falares, música folclórica, poesia popular, traços arquitetônicos etc. Assim, açorianidade vai legitimar-se na existência de um repertório cultural comum cuja origem remonta aos Açores. (...)"
Excerto de O Atlântico Açoriano de Eugenio Pascele Lacerda
Viva o Divino Espírito Santo
Gostaria de ver aqui discutida a açorianidade da adoração do DES, fóra do enquadramento das festas reinventadas em PD.
Existe, ou não, açorianidade nas expressões populares de adoração do DES? Essa expressão é, ou não, independente do tamanho da coroa?
"O pai era Fernando do Quental, (1814-l873) – um dos “bravos” do Mindelo - , casou aos 22 anos e tinha 28 quando Antero nasceu (1842) . Tinha uma personalidade muito fora do comum, originalíssima, extrovertida em extremo, comunicando quer entre familiares, quer com os foliões, viajado pela Europa, culto e, ao mesmo tempo, capaz de conviver com o povo, apreciando as suas festas, sendo até mordomo de Impérios do Divino Espírito Santo, segundo as tradições açorianas. Contam os amigos que, num desses passeios pela Europa, numa cidade alemã, assistindo a uma homenagem a qualquer vulto importante da terra, ficou muito emocionado e desatou a gritar com toda a força: - Viva o Divino Espírito Santo!"
"Carreiro, José Bruno Tavares – Antero de Quental - Subsídios para a sua biografia Vol. I Ed. Instituto Cultural de Ponta Delgada, Lisboa – 1948. pp. 20-25."
referenciado por "Aspectos da evolução da psicologia de Antero" ( http://www.geocities.com/bergen47/lucia-6-anteroo-1-ensaio.htm#_ednref7 )
Existe, ou não, açorianidade nas expressões populares de adoração do DES? Essa expressão é, ou não, independente do tamanho da coroa?
"O pai era Fernando do Quental, (1814-l873) – um dos “bravos” do Mindelo - , casou aos 22 anos e tinha 28 quando Antero nasceu (1842) . Tinha uma personalidade muito fora do comum, originalíssima, extrovertida em extremo, comunicando quer entre familiares, quer com os foliões, viajado pela Europa, culto e, ao mesmo tempo, capaz de conviver com o povo, apreciando as suas festas, sendo até mordomo de Impérios do Divino Espírito Santo, segundo as tradições açorianas. Contam os amigos que, num desses passeios pela Europa, numa cidade alemã, assistindo a uma homenagem a qualquer vulto importante da terra, ficou muito emocionado e desatou a gritar com toda a força: - Viva o Divino Espírito Santo!"
"Carreiro, José Bruno Tavares – Antero de Quental - Subsídios para a sua biografia Vol. I Ed. Instituto Cultural de Ponta Delgada, Lisboa – 1948. pp. 20-25."
referenciado por "Aspectos da evolução da psicologia de Antero" ( http://www.geocities.com/bergen47/lucia-6-anteroo-1-ensaio.htm#_ednref7 )
Açorianidade?
"(...) A Açorianidade exprime mais que a simples caracterização tipológica do homem açoriano. Ela implica que se cria um elo com a terra, uma obrigação interior ditada por uma essência histórica assumida individualmente, uma "dívida" para com a terra que nos viu nascer. (...)"
António Machado Pires, O Homem Açoriano e a Açorianidade.
sexta-feira, julho 06, 2007
Às vezes o rei vai nu.
Ao longo da vida vestimos aquilo que julgamos que nos define. Temos várias indumentárias, para várias ocasiões. Umas velhas outras novas, ou renovadas, umas mais vistosas, outras mais comedidas.
Uma das indumentárias de que mais me orgulho de ter adquirido, é aquela que uso e que penso me define como açoriano.
Estou a viver em S. Jorge, há já alguns meses. Uma experiência que poderei vir a partilhar, com algum regularidade, nestas páginas. Quando chegamos, uma das minhas novas colegas pediu-me companhia na procura de um sítio para alugar. Num dos sítios visitados, que acabou por ser o escolhido, a minha colega foi apresentada às vantagens do domicilio em questão, e foi avisada de que a casa tinha tv por cabo mas só com acesso ao canal 1, tvi, sic e a rtp S. Miguel… Pedi à senhoria que repetisse, e ela sem remorso, nem maldade repetiu, rtp S. Miguel. Procurei sarcasmo na voz, inteligência no sorriso, mas nada. Simplesmente facto emanava da sua face. Fiquei estupefacto, ofendido, até mesmo quase indignado. Mas de repente senti que estava completamente nu, neste novo palco, simplesmente coberto pela minha pele de micaelense.
Uma das indumentárias de que mais me orgulho de ter adquirido, é aquela que uso e que penso me define como açoriano.
Estou a viver em S. Jorge, há já alguns meses. Uma experiência que poderei vir a partilhar, com algum regularidade, nestas páginas. Quando chegamos, uma das minhas novas colegas pediu-me companhia na procura de um sítio para alugar. Num dos sítios visitados, que acabou por ser o escolhido, a minha colega foi apresentada às vantagens do domicilio em questão, e foi avisada de que a casa tinha tv por cabo mas só com acesso ao canal 1, tvi, sic e a rtp S. Miguel… Pedi à senhoria que repetisse, e ela sem remorso, nem maldade repetiu, rtp S. Miguel. Procurei sarcasmo na voz, inteligência no sorriso, mas nada. Simplesmente facto emanava da sua face. Fiquei estupefacto, ofendido, até mesmo quase indignado. Mas de repente senti que estava completamente nu, neste novo palco, simplesmente coberto pela minha pele de micaelense.
quinta-feira, julho 05, 2007
Parabéns, Yankee doodle, doodle, dandy América!!!
Assim começa a declaração de Independência dos Estados Unidos da América.
"Quando, no curso dos acontecimentos humanos, se torna necessário a um povo dissolver os laços políticos que o ligavam a outro, e assumir, entre os poderes da Terra, posição igual e separada, a que lhe dão direito as leis da natureza e as do Deus da natureza, o respeito digno às opiniões dos homens exige que se declarem as causas que os levam a essa separação.
Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade."
Um momento sublime da natureza humana.
Pena que outros tantos Homens, também aqui entre nós, não se revejam nestas palavras em cada dia que se cria e recria Açores.
Pena maior que estes homens, de então, não tenham percebido que às “leis da natureza e as do Deus da natureza” se deveriam ter imposto as do Homem e que quando se referissem a “Nós o Povo” com direito “a vida, a liberdade e a procura da felicidade”, Nós, com letra grande, não era referente só a eles, e aos seus, mas sim, também, aos que começavam a encurralar em “reservas” e aos outros que, já há algum tempo, vinham a escravizar.
"Quando, no curso dos acontecimentos humanos, se torna necessário a um povo dissolver os laços políticos que o ligavam a outro, e assumir, entre os poderes da Terra, posição igual e separada, a que lhe dão direito as leis da natureza e as do Deus da natureza, o respeito digno às opiniões dos homens exige que se declarem as causas que os levam a essa separação.
Consideramos estas verdades como evidentes por si mesmas, que todos os homens são criados iguais, dotados pelo Criador de certos direitos inalienáveis, que entre estes estão a vida, a liberdade e a procura da felicidade."
Um momento sublime da natureza humana.
Pena que outros tantos Homens, também aqui entre nós, não se revejam nestas palavras em cada dia que se cria e recria Açores.
Pena maior que estes homens, de então, não tenham percebido que às “leis da natureza e as do Deus da natureza” se deveriam ter imposto as do Homem e que quando se referissem a “Nós o Povo” com direito “a vida, a liberdade e a procura da felicidade”, Nós, com letra grande, não era referente só a eles, e aos seus, mas sim, também, aos que começavam a encurralar em “reservas” e aos outros que, já há algum tempo, vinham a escravizar.
quarta-feira, julho 04, 2007
I am back !!!
Não temais, ò bloggers micalenses e açorianos, pois estou de volta, para salvar a blogosfera açoriana, e escrever frases longas, cheias de vírgulas.
Agradeço, desde já, aos meus pais, aos meus avós e irmãos, a Deus, e à Mariana, que por mim esperou sentada.
Agradeço, desde já, aos meus pais, aos meus avós e irmãos, a Deus, e à Mariana, que por mim esperou sentada.
Passos curtos...pares ímpares...
As lojas da Cultura são um grande passo para a divulgação da Cultura Açoriana. Não querer entender isso é ter do mundo a medida de uma grande e mal lustrada biqueira de sapato; que nem a mais fresca lufada de ar, resolve.
terça-feira, julho 03, 2007
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