terça-feira, novembro 30, 2010

Pessoa













"I know not what tomorrow will bring."

terça-feira, novembro 23, 2010

HAJA SAÚDE



O caso sério que poderia ter sido a falta de apoio psiquiátrico a um doente durante o fim-de-semana no Hospital de Ponta Delgada revela que no braço de ferro entre o Governo Regional e a Ordem dos Médicos alguém se esqueceu da ética e da deontologia profissionais.
Quem se lembra de médicos em horas de prevenção às urgências a encher os bolsos nas suas consultas privadas, não deixa de pensar que em nome de um certo humanismo em desuso seria bem melhor aplicar o tradicional juramento de Hipócrates do que agir pela hipocrisia.
As ordens deveriam ser algo mais do que escudos protectores dos interesses profissionais.

sexta-feira, novembro 12, 2010

Herberto Hélder - Os passos em volta

"Era uma vez um pintor que tinha um aquário com um peixe vermelho. Vivia o peixe tranquilamente acompanhado pela sua cor vermelha até que principiou a tornar‑se negro a partir de dentro, um nó preto atrás da cor encarnada. O nó desenvolvia‑se alastrando e tomando conta de todo o peixe. Por fora do aquário o pintor assistia surpreendido ao aparecimento do novo peixe.
O problema do artista era que, obrigado a interromper o quadro onde estava a chegar o vermelho do peixe, não sabia que fazer da cor preta que ele agora lhe ensinava. Os elementos do problema constituíam‑se na observação dos factos e punham‑se por esta ordem: peixe, vermelho, pintor – sendo o vermelho o nexo entre o peixe e o quadro através do pintor. O preto formava a insídia do real e abria um abismo na primitiva fidelidade do pintor.
Ao meditar sobre as razões da mudança exactamente quando assentava na sua fidelidade, o pintor supôs que o peixe, efectuando um número de mágica, mostrava que existia apenas uma lei abrangendo tanto o mundo das coisas como o da imaginação. Era a lei da metamorfose.
Compreendida esta espécie de fidelidade, o artista pintou um peixe amarelo."

Publicado pela editora Assírio e Alvim

müz´ka

quarta-feira, novembro 10, 2010

O Dilema do bom aluno...

Durante algum tempo tive sérias dúvidas sobre a política de finanças públicas adequada para a nossa Região.

A dúvida era se, por um lado deveríamos seguir uma política de finanças públicas equilibradas, em que apenas gastaríamos o correspondente às nossas receitas, condicionando o crescimento do nosso PIB apenas ao efeito multiplicador das nossas receitas, ou se, por outro lado, deveríamos seguir uma política orçamental expansionista keynesiana, gastando mais em investimento e em despesa do que a receita existente, em que o recurso ao crédito permitisse suprir as dificuldades imediatas de financiamento, alavancar o investimento e multiplicar o nosso PIB.

Os dois modelos têm os seus defeitos e virtudes, que provavelmente se acentuam consoante a região e o momento em que são aplicados.

Vejamos alguns exemplos:

No caso da Madeira, a política orçamental expansionista foi obviamente visível com a aposta em obras públicas, que fizeram crescer a região a um bom ritmo durante algum tempo. Mas esta política levada a cabo por Alberto João Jardim fez com que a dívida directa do arquipélago disparasse para valores acima de 27% do seu PIB, limitando, em muito, a possibilidade futura de recorrer ao crédito quando este fosse mesmo necessário para combater uma crise económica ou uma calamidade, pois os bancos nunca emprestam a quem já está muito endividado. É claro que se o Governo da República sustentar ou avalizar sempre as dívidas contraídas pelo arquipélago, este será de longe o modelo ideal a seguir.

No caso do nosso país, o problema, a meu ver, está no nível de endividamento que o Estado atingiu para obter um nível de alavancagem de investimento baixo e/ou pouco reprodutivo. Num investimento de 100 ME, se a União Europeia financiar 80 e o Estado tiver recorrer ao crédito para obter os 20 que faltam, parece-me óbvio que deve fazê-lo. O que não deve fazer é pagar 80 para obter da UE 20, num investimento que terá um retorno de 30. Muito menos deverá esconder os investimentos em empresas públicas para que não contem para o défice orçamental. No caso dos Açores, a política orçamental deste Governo foi de abdicar de um crescimento exponencial do PIB, mesmo assim atingindo taxas de crescimento acima de Portugal e da UE, a favor de finanças públicas equilibradas e respeitadas pelo Ministério das Finanças e pelas instituições de crédito.

Mas muitos poderão perguntar, como eu o fiz, qual a vantagem de ter contas públicas equilibradas se quando temos necessidade de recorrer ao investimento para combater uma crise económica que nos atinge a todos, o Estado nos limita o endividamento de que precisamos para ajudar as empresas e sustentar o emprego? Por via disso não estaremos, em altura de aperto, apesar das contas publicas controladas, na mesma situação que a irresponsável Madeira?

A resposta, pelos últimos acontecimentos, é claramente que não. O facto de termos um nível de endividamento tão baixo faz com que em épocas de crise o Governo possa recorrer ao crédito, nos casos autorizados, a uma taxa de juro muito baixa, tenha folga orçamental para pagar aos seus fornecedores a menos de 30 dias e possa incluir no seu orçamento um conjunto de medidas para minorar os efeitos da austeridade vinda do continente.

Bons exemplos disso são o novo apoio designado como “remuneração compensatória”, que irá compensar inteiramente, em 2011, a perda de vencimento dos funcionários públicos que auferiam uma remuneração mensal ilíquida entre 1500 e 2000 € e que abrangerá cerca de 3700 funcionários públicos, ou a suspensão dos aumentos das comparticipações familiares pela utilização de serviços de ama, creches, jardins-de-infância e centros de actividades de tempos livres (ATLs).

Muitos poderão dizer no continente que esta não é uma altura de dar benesses aos funcionários públicos, nem de aumentar transferências sociais. Nós poderemos honradamente responder que, enquanto uns gastam, em submarinos, em estradas de necessidade questionável ou em transferências para empresas públicas já há muito tempo falidas, nós preferimos continuar gastar os nossos recursos com as pessoas…

Artigo publicado na edição de domingo, dia 7 de Novembro de 2010, no Jornal Açoriano Oriental e na Rádio Atlântida no dia 13 do mesmo mês.

terça-feira, novembro 02, 2010

"Pessoas Sensíveis"

Sophia de M.B. Andresen escreveu um poema sobre "pessoas sensíveis". Diz dessas (desse tipo de ser humano) que são aquelas pessoas que "não são capazes/ de matar galinhas/ Porém são capazes/de comer galinhas" ou ainda aquelas pessoas a quem o "Senhor" deve perdoar "porque eles sabem o que fazem".
O mundo em que vivemos está cheio de pessoas assim, capazes de vender a alma ao diabo, para aconchego das suas próprias dores. Ou porque não sabem viver de outra maneira (já dizia um outro poeta português que "saber viver é vender a alma ao diabo") ou pura e simplesmente porque não têm outra escolha senão mesmo ser assim "sensíveis" (com aspas) …
O poema de Sophia M.B. Andresen é em si mesmo um tratado que algumas pessoas, sobretudo estas de uma "sensibilidade aguçada" deviam ler todos os dias, pela manhã, antes de se dirigirem ao seu trabalho.
É um poema que separa, claramente, o empenhamento social e político que não receia a denúncia das injustiças reais, a procura da resolução dos problemas do empenhamento hipócrita dos que aclamando o bem comum (ou mesmo pessoal e particular) são "sensíveis" de mais para matar galinhas (resolver os problemas).
É claro que é uma enorme metáfora. Mas, não deixará de ser, pelo menos, uma metáfora interessante e, do ponto de vista da escrita e crítica social, muito inteligente.
Usamos normalmente a palavra sensibilidade para outras situações. Dizemos que fulano e sicrano são muito sensíveis a qualquer coisa, que estamos sensíveis com a situação y ou que a sensibilidade extrema de um certo e determinado indivíduo levou-o a realizar a obra x, por exemplo.
É assim essa noção global de sensibilidade que a poetisa – em poucas palavras – enquadra noutro âmbito, oferecendo ao leitor estas "pessoas sensíveis"…que são duplas e muitas vezes triplas.
Essas, que sofrem da incapacidade de matar galinhas, mas estão sempre prontas para comê-las. Falta-lhes autenticidade e originalidade. Usam e abusam da ilusão. São devotos de uma certa linha de pensamento.
E Sophia de M.B. Andresen condena-lhes a hipocrisia. Chama-os "vendilhões do templo". São Falsos. São imorais. Mas, "sensíveis".
As sociedades vivem-se (também) por pessoas assim, é certo.
E por isso a crónica de hoje (no princípio de Novembro já quase no Natal) é sobre essas "pessoas sensíveis" porque as há por todo o lado e de todos os feitios.
A mão que a escreve (à crónica) não teve outra intenção, senão analisar um poema, sem a carga das análises poéticas das aulas de português, e, através dele, falar do rigor dos modos e do declinar dos tempos…
Apoiamos sempre a luta pela justiça e pela verdade, rejeitando a fatalidade destes seres "sensíveis" que (ainda) acham que a maledicência pode vencer a verdadeira "consciência convicta" (Antero de Quental) dos homens e das mulheres cujos rostos trazem marcados "a terra, o sol, o vento e o mar" (Sophia de M.B. Andresen).
Seja como for um outro poeta português escreveu – um dia – que " o livre ilhéu mesmo morto não cora se espernear". Poderá (até) ser assim mesmo. E se não for, o tempo de vida que ainda (nos) falta ditará a verdade sobre quantos de nós (mais ou menos "sensíveis" ou sensíveis) serão (ou não serão?) capazes de entender enfim que a mentira tem perna curta (como diz e bem o provérbio) e que a hipocrisia, a cobardia e a falsidade, sendo males maiores, acabam sempre, como o azeite, por vir à tona.
Cá os esperaremos. Hoje. Como para sempre. Serenamente.

segunda-feira, novembro 01, 2010

A crítica fácil corrói a lucidez

Como é do conhecimento público, foram já publicadas as alterações das regras de serviço público de transporte aéreo, que vão permitir que os açorianos disponham de tarifas aéreas promocionais ao preço médio de cem euros.

Esta tinha sido uma promessa anunciada em Abril deste ano. Desde então, o Governo Regional dos Açores trabalhou, serena e consistentemente, neste objectivo, imune ao ruído que gerou à volta desta matéria, quase sempre produzido por um PSD/Açores que pensava que esta redução nunca iria acontecer.

Para memória futura, será conveniente lembrar a postura do maior partido da oposição relativamente a este dossier, o qual, ao longo de meses, sempre mostrou uma atitude destrutiva. É a prova provada que, para o PSD/Açores, vale mais criticar o Governo Regional do que se regozijar com uma boa medida ao serviço dos açorianos. É o ressabiamento político crónico, que tolhe a visão e limita a responsabilidade. Recorde-se que, no final de Julho, a própria líder do PSD/Açores defendia – e cito – “que é preciso baixar as tarifas aéreas. Não é apenas prometer, falar em reduções, é preciso cumprir”.

Pois bem, está na hora de Berta Cabral reconhecer que já está cumprido este ponto, a bem da coerência e da sua credibilidade políticas. Depois, na mesma estratégia cega, foi o Grupo Parlamentar do PSD/Açores a endereçar, em Agosto, um requerimento a questionar o Governo relativamente à “data que serão disponibilizadas as passagens aéreas com preço inferior a 100 euros”.

Muito bem, este ponto está também perfeitamente definido com a publicação das novas regras. Seria, assim, recomendável que os deputados sociais-democratas reconhecessem a bondade de uma medida tomada em favor dos açorianos. O que fez o PSD/Açores? O costume. Limitou-se a desvalorizar, agora, o que antes exigia saber quando entrava em vigor. Ou seja, antes a líder do PSD/Açores “exigia” saber quando os açorianos teriam acesso a tarifas mais baixas. Agora, que já foram anunciadas, o deputado Jorge Macedo diz que a “montanha pariu um rato”. É caso para dizer que a “montanha” foi a estratégia do PSD/Açores de denegrir esta medida.

Temos, pois, um PSD/Açores em negação dos Açores. Além disso, os transportes serão, porventura, dos sectores em que o PSD/Açores terá menos legitimidade para criticar os governos socialistas. Basta referir dois pontos: Quando o PSD era Governo, os Açores apenas tinham uma SATA limitada aos voos entre as ilhas e uma dependência da TAP para as ligações ao exterior.

Foram os governos socialistas que criaram a SATA Internacional, companhia que obteve o Certificado de Operador Aéreo em Junho de 1998. No tempo que o PSD assumia funções governativas, uma passagem para Lisboa custava a módica quantia de 60 contos (cerca de 300 euros), valor da altura muito mais elevado do que a tarifa regular de hoje em dia.

Mesmo sem actualização de preços, era mais caro viajar em 1996 do que é hoje em dia. Bastam estes dois factores para se perceber qual é o património do PSD/Açores em matéria de transportes aéreos. Mas isso é passado. O que interessava mesmo era que o PSD de Berta Cabral ficasse satisfeito com o bem dos açorianos. Mas isso não acontece porque a tentação de falar mal do Governo se sobrepõe a qualquer raciocínio lúcido deste partido.

müz´ka