segunda-feira, maio 23, 2011

Vale tudo em política?



Esta semana tivemos um claro exemplo daquilo a que se presta este PSD/Açores. Deparando-se com falta de argumentos regionais neste período de campanha eleitoral, o PSD/Açores resolveu rapidamente a questão no seu pior estilo: montou uma campanha negra para denegrir o Governo Regional e o PS/Açores.

Vamos a factos concretos que provam isso mesmo.

O Governo apresentou à Assembleia Legislativa uma proposta de Código de Acção Social. Este diploma estava a ser trabalhado pelo Governo há muito meses e deu entrada no Parlamento muito antes de se saber os contornos do acordo entre Portugal e a troika para ajudar externa a Portugal.

Esta proposta esteve em análise e debate na Comissão Permanente especializada, onde os deputados do PSD não apresentaram propostas de alteração. Mas mais. Agarraram-se a uma minudência técnica, reportada a prazos regimentais, para que o Código de Acção Social não fosse a debate e votação no plenário que decorreu esta semana. Era um truque para o que viria a seguir.

Na quinta-feira, Marques Mendes, antigo líder do PSD, vai para a TVI acusar o Governo Regional de querer criar mais Parcerias Público-Privadas (PPP) nos Açores, com base no que estava previsto na proposta do Código de Acção Social. Não se coíbe de utilizar adjectivos que desqualificam os Açores, mais uma vez, no âmbito nacional. Alega que o Governo Regional vai criar mais Parcerias Público-Privadas, ao arrepio do que diz o memorando de entendimento assinado entre Portugal e a troika, e faltar à solidariedade nacional.

Foi esta a tramóia armada. Riram-se muito, com certeza, da sua própria desonestidade, da facilidade com que conseguem denegrir a sua terra fora de portas, da destreza em criar um facto de campanha, ainda que à custa do que deveria ser o seu trabalho parlamentar responsável.

Por um lado, temos o cabeça-de-lista, Mota Amaral, a dizer – e bem – que quer fazer uma campanha de esclarecimento dos açorianos. Por outro, temos este PSD/Açores que se rege por esquemas em que a indução do engano ou da mentira é o principal ingrediente.

Já se sabe qual será o próximo passo: depois de lançarem a lebre, agora iremos assistir aos dirigentes regionais do PSD, muito indignados com esta situação, como se não fossem eles mesmos os obreiros destes esquemas. É sempre assim. Foi assim com a polémica da remuneração compensatória, que, ironia das ironias, o PSD agora aplica nas suas câmaras municipais.

Para que fique claro, o Governo Regional não vai criar mais nenhuma PPP. Aliás, só existem nos Açores três parcerias deste estilo: uma, para as estradas SCUT de São Miguel, outra, para a construção do novo Hospital da Terceira, e a última para a construção do Centro de Radioterapia dos Açores.

Três investimentos que são, inequivocamente, para servirem os açorianos, evitando, por exemplo, que pessoas com cancro tenham de se deslocar para o Continente para tratamentos.

Tenho de admitir que o PS/Açores e o Governo Regional caíram nesta armadilha. Não pensavam ser possível que o PSD/Açores achasse útil denegrir o nome dos Açores no país, apenas e só, para criar um facto político na Região. É, sem dúvida nenhuma, um exemplo de um péssimo serviço feito à Autonomia. Aposto que o drº Mota Amaral, que considero um grande autonomista, concorda comigo...

Guaranteed

On bended knee is no way to be free
Lifting up an empty cup, I ask silently
All my destinations will accept the one that's me
So I can breathe...

Circles they grow and they swallow people whole
Half their lives they say goodnight to wives they'll never know
A mind full of questions, and a teacher in my soul
And so it goes...

Don't come closer or I'll have to go
Holding me like gravity are places that pull
If ever there was someone to keep me at home
It would be you...

Everyone I come across, in cages they bought
They think of me and my wandering, but I'm never what they thought
I've got my indignation, but I'm pure in all my thoughts
I'm alive...

Wind in my hair, I feel part of everywhere
Underneath my being is a road that disappeared
Late at night I hear the trees, they're singing with the dead
Overhead...

Leave it to me as I find a way to be
Consider me a satellite, forever orbiting
I knew all the rules, but the rules did not know me
Guaranteed


Eddie Vedder

segunda-feira, maio 16, 2011

Está a brincar connosco? Não está?



As próximas eleições legislativas têm justificado, da parte de alguns intervenientes políticos, um conjunto de intervenções descabidas, para não dizer, no mínimo caricatas. Desde os episódios “Catroga”, em que são utilizadas comparações de mau gosto entre Hitler e Sócrates, ao vice-presidente do PSD, Diogo Leite Campos, que afirma, numa entrevista à SIC, “Será que 5800 euros, para casa, roupa lavada, comida instrução dos filhos doença e tudo é muito?”, parece-me que se perdeu um pouco da noção realidade em que vivemos.

Nada de mau, num país que necessita, nestes tempos de algum sentido de humor, não fossem estes senhores, putativos governantes, que o povo no próximo dia 5 de Junho julgará.

Mas, se não considero muito graves estas afirmações, de mau gosto e honestamente infelizes, destes protagonistas pouco experientes na vida política, já acho muito graves afirmações de outros protagonistas políticos, que, premeditadamente, consideram que com verdades óbvias e com muito paleio podem enganar quem os escuta para decidir o seu voto.

Na passada semana, a líder do PSD Açores, brindou-nos com uma entrevista extraordinária à RTP, com algumas afirmações e contradições que devemos ter em atenção

A primeira pérola da líder do PSD, que não resisto em salientar é quando tenta, num meritório exercício da língua portuguesa, numa frase, ficar bem com Deus e com o Diabo, afirmando que a posição de preservação da Lei de Finanças Locais pela parte do PSD não está em causa, apesar do seu programa eleitoral afirmar exactamente o contrário. Penso que os autarcas do PSD, perceberam claramente a posição, de La Palisse, da sua líder regional quando afirma: “A Lei de Finanças Locais não vai ser alterada enquanto não for objecto de alteração”.

Mas o jogo de enganos continua. Algumas semanas depois do porta-voz do PSD para as finanças, Dr. Eduardo Catroga, numa intervenção muito emocionada, afirmar que foi graças ao PSD que a “negociação com a Troika resultou num enorme sucesso”, a líder do PSD Açores, na mesma entrevista, acusa o Partido Socialista de não ter conseguido na negociação da Troika, segurar a diferenciação fiscal de 30%.

Convêm que o PSD se decida sobre o que diz. Utilizando os argumentos do PSD, ou a negociação com a Troika foi um insucesso e a culpa é do PSD ou então a negociação foi um sucesso e a responsabilidade é PSD, o que nunca pode ser dito, em coerência, é que a negociação foi um insucesso e a culpa é do PS.

Mas se para o PSD Açores, perder um mecanismo de competitividade como 10 pontos percentuais de diferenciação fiscal é grave, já não é tão grave que o programa do PSD, transfira das autonomias regionais para as autarquias, competências ao nível da saúde e da educação. Como também, não é grave que se aceite ter no seu programa eleitoral a privatização da empresa que gere os aeroportos nacionais, ANA EP, passando os aeroportos dos Açores à sua responsabilidade, para a responsabilidade do Governo Regional.

Para o PSD Açores este assunto é pacífico, pois a Região gere os seus aeroportos com algum sucesso.

Importam-se de repetir??

Para além do facto extraordinário, de que foi preciso, o PSD ficar entre a “espada e a parede”, para admitir que o Governo dos Açores tem sucesso a gerir alguma coisa, a Dr. Berta Cabral esqueceu-se de referir, que estes aeroportos da responsabilidade da ANA, apresentam anualmente um défice de operacional de 9 milhões de euros, que passariam agora para a responsabilidade da Região.

Muitos dirão que este tipo de afirmações sem sustentação, são normais em política, sobretudo em alturas eleições, para disfarçar erros cometidos ou para ganhar dividendos à custa da má imagem dos outros. Não concordo, nem acho que seja necessário avançar por este caminho.

Nesta altura de aflição e de dificuldades para todos, os políticos têm de perceber que o mundo mudou e que quanto mais sinceros forem com os cidadãos, maior será a probabilidade de sucesso...

terça-feira, maio 10, 2011

Branco é, galinha o põe

Noticiaram os jornais e a televisão, nos Açores, que Ponta Delgada era a primeira cidade portuguesa a integrar a “United Hope Project”, cujo grande objectivo, é colocar o “Anjo da Esperança” em 49 países de todo o mundo, como símbolo de união, amor e esperança num futuro melhor.
Como quase todos os eventos anunciados em Ponta Delgada, por iniciativa camarária, o anjo esculpido chegou envolto num mistério de compaixão e amor que quase nos comovia, olhando para o seu ar quedo e mudo, colocado no seu peso de 32 quilos e alguns euros, em plenos Paços de Concelho.
Diferente da coroa gigante e luzidia das ilustres “Grandes Festas grandes” do Espírito Santo, este anjo será talvez (?), um dia, para vir a colocar no Museu do maior arquitecto vivo da história da arquitectura mundial, ou, então quem sabe, não se transformará num prenúncio da esperança que por aqui escasseia, palmo a palmo, ou passo a passo, no espaço deste concelho feliz?
Alindado à boa moda das políticas “toca e foge”, o anjo fez-nos lembrar a mítica cidade “Asa Branca” da telenovela brasileira dos anos 80 e, por razões óbvias, o poema “A Queda de um Anjo” de Camilo Castelo Branco…
Mas, adiante, (o peso dos anjos fica para quem pode suportá-lo), não podemos deixar passar em claro, a grande vitória dos jovens açorianos no “Campeonato Nacional das Profissões”.
Com efeito, estas vitórias deviam ser motivo de orgulho para toda a gente, alunos, famílias, professores e pessoas, em geral, mas, pelos vistos, não são…
Há sempre quem se apresse a usar o espaço, ou a plateia de um campeonato destes para criticar os sucessos da formação profissional nos Açores, esquecendo-se que os primeiros alvos desse desdém são os jovens açorianos que optaram por esta via de qualificação profissional e que mostraram neste Campeonato o brio e a vontade de se ser bom e melhor naquilo que se faz todos os dias.
Ora tais traços de personalidade vão escasseando em algumas vertentes da nossa vida, em muitas áreas, a que a política e alguns políticos não são (nem estão) alheios…
Talvez seja por isso que num momento importante para os Açores, como a realização do “Campeonato Nacional das Profissões”, em Ponta Delgada, os jovens ali representados tenham dado tudo por tudo para vencer e deixar ficar na Região vinte das vinte e cinco medalhas a concurso, enquanto ali por perto, não muito longe, um anjo de pedra “empoleirado” era só isso mesmo: um anjo de pedra num poleiro de esperança e dizem que compaixão e dizem que amor…
Haja saúde e muita paciência.

segunda-feira, maio 09, 2011

A Troika e o País



Muitos portugueses ainda não compreenderam bem o que significa o acordo do Governo de Portugal com a troika - FMI, Comissão Europeia e BCE - para as suas vidas nos próximos 4 anos. Não perceberam, também, se este acordo é bom ou mau ou, então, se é bom para alguns e mau para outros.

As respostas a estas dúvidas são complexas, sendo facilmente alvo das mais simples demagogias. Este acordo, pela sua austeridade, é pior para os portugueses do que o PEC IV, mas, tendo em conta as nossas necessidades presentes de financiamento e de sustentação do sistema bancário, foi negociado de forma brilhante, não sendo tão penalizador quanto é habitual nestes casos de ajuda externa.

Para arranjar um exemplo mais perceptível, imaginemos uma família da classe média com dificuldades em pagar uma dívida ao banco, que se propõe, para não perder a casa, o carro ou a educação dos filhos, cortar em despesas como combustível, electricidade, empregada de limpeza e bens de luxo.

Esta família sabe que, caso estas propostas não fossem aceites pelos credores como credíveis, teria de aceitar um plano de poupança feito por estes, com muito maiores penalidades para todo o agregado, pois estes não estão preocupados com a família mas sim com a sua dívida. Esta família também sabe, pelo exemplo dos seus vizinhos já falidos, que estes planos impostos pelos credores podem implicar, para além do que já estava proposto, outros cortes nas despesas de saúde e de educação dos seus filhos, a venda de um dos carros ou até a troca da casa para uma muito mais pequena.

Se quisermos dar a este exemplo exactamente o mesmo sentido do que aconteceu em Portugal, basta imaginar que o plano de contenção de despesa da família foi aceite pelos credores e que, no acto do acordo, um dos membros do agregado se recusa a assinar, dizendo que o programa era muito austero para a família. Após este momento, os credores, deixando de acreditar na capacidade de pagamento da família, negoceiam com um dos membros um acordo mais austero do que o que inicialmente tinha sido proposto, mas não tão duro quanto o habitual.

Se por um lado fomos penalizados, por estarmos sujeitos aos credores, devemos ter consciência que o resultado final foi um sucesso face ao que é habitual nestes casos.

Em países como a Irlanda ou a Grécia, as medidas da troika significaram um aumento muito maior da carga fiscal, o fim da diferenciação fiscal entre regiões, o despedimento e redução de ordenados de funcionários públicos e privatização de alguns serviços públicos, só para dar alguns exemplos.

Em Portugal, apesar de o acordo ser mais favorável, não nos livramos de alguns aumentos de impostos, nomeadamente a subida do IMI, do imposto sobre o tabaco, imposto automóvel e da passagem de alguns produtos de taxa reduzida de IVA para a taxa intermédia ou máxima. Para além destas subidas, serão introduzidas limitações muito significativas à comparticipação dos seguros de saúde públicos (ADSE entre outros), bem como restrições a benefícios e deduções fiscais em áreas como educação e saúde.

Estas penalizações irão ser aplicadas progressivamente durante próximos 3 anos, obrigando a classe média a um reajuste do seu consumo abrupto e violento.

Nos Açores, contrariamente ao que é dito e face às expectativas negativas de fim da diferenciação fiscal com o continente, como a Comissão Europeia sempre defendeu, conseguimos segurar este princípio, abdicando de 10 pontos percentuais, mas mantendo a diferença nos 20%. Este resultado de negociação permite-nos poupar a aumentos cerca de 98% da população que paga IRS e aumentar apenas o IVA em 1% nos produtos de taxa baixa e intermédia (bens essenciais) e em 2% sobre os produtos vendidos à taxa normal. Na prática, o efeito das medidas específicas para as regiões autónomas praticamente não terá expressão no rendimento das famílias, sendo estas, tal como todas as outras, prejudicadas sim pelas medidas de âmbito nacional.

Face a estas medidas, muitos poderão pensar que os partidos que se concorrem a eleições estão limitados no seu programa eleitoral apenas ao que está no documento da Troika. Não concordo. Tal como a família tinha opção na negociação de escolher entre cortar na educação ou cortar no carro, nós também temos.

Para a troika apenas interessa que a capacidade do país em pagar as suas dívidas seja sustentável a longo prazo. Entre privatizar a saúde e tornar o SNS eficiente há genericamente uma consequência orçamental comum de redução, mas também há uma consequência social. Há uma opção a tomar… É para isto que servem estas eleições.

quinta-feira, maio 05, 2011

CONTRADIÇÕES

Eduardo Catroga afirma pomposamente a sua autoria nas negociações com o FMI.
Berta Cabral garante que o acordo foi mau.
Se o primeiro não fez o que diz, é natural que a segunda fale do que ele fez.

terça-feira, maio 03, 2011

O cheque e a “tempestade perfeita”

Quando cheguei a casa, depois de uma deslocação habitual à ilha do Faial, deparei-me, entre a habitual correspondência, com uma carta de uma instituição bancária de quem sou cliente há muitos anos que me chamou a atenção.

Esta carta, escrita de forma a convencer-me que se continua a viver no melhor dos mundos, apresentava-me um crédito ao consumo, já pré-aprovado, no montante de 10 mil euros, obviamente com uma taxa de juro bastante elevada, tendo em conta o tipo de crédito em causa.

Para cair nesta ratoeira em forma de carta, que muitos dos leitores certamente já receberam, bastava que assinasse o “cheque” anexo e que o entregasse num balcão da tal referida instituição bancária.

Depois, seria fácil! Seria gastar os 10 mil euros na compra de um qualquer bem supérfluo, numa viagem magnífica de sol e praia ou num carro de acordo com as minhas preferências. Pagaria esta minha extravagância nos próximos anos, através de uma mensalidade de cerca de 250 euros.

Este episódio, que mais não é do que uma pequena amostra dos erros que a banca ainda comete, passou-se muito recentemente no “olho” daquilo que muitos especialistas já chamam a “tempestade perfeita” que vai atingir os portugueses nos próximos tempos.

Esta “tempestade perfeita”, de forma simples, define-se por um corte substancial dos rendimentos familiares e aumento dos impostos, devido à austeridade que o FMI vai impor, ao aumento do risco de desemprego devido à desaceleração da economia, ao mesmo tempo que aumentarão as taxas de juros definidas pelo Banco Central Europeu, assim como os “spreads” praticados pelos bancos e a taxa de inflação no país.

Tudo isso vai resultar, no mínimo, em menos dinheiro de cada família para pagar mais despesas. Não é, por isso, preciso ser-se um génio da economia para, rapidamente, se chegar à conclusão, que o que qualquer português menos precisa, nos próximos tempos, é afundar-se no crédito ao consumo, com taxas elevadas e de necessidade duvidosa.

Este cenário deveria implicar, ainda, que os bancos assumissem uma responsabilidade acrescida e não entrassem, novamente, na roda-viva do crédito fácil ao consumo. Estamos a falar de instituições que foram, em parte, responsáveis pelo grande endividamento das famílias portuguesas durante os últimos anos.

Se é verdade que não obrigaram ninguém a contratar crédito, também é verdadeiro que as campanhas publicitárias extremamente agressivas, quase a roçar o assédio, em conjugação com taxas de juro apetecíveis, levaram a que muitas famílias portuguesas se tenham afundado em crédito com taxas de esforço quase incomportáveis. Em bom rigor, a responsabilidade é das duas partes.

O que se exigia, agora, é um maior grau de responsabilidade das instituições bancárias, muitas delas com problemas de liquidez e de financiamento externo.

Estas instituições têm de perceber que, na nova realidade portuguesa, será muito difícil a qualquer governo salvar um banco, caso entrasse em colapso, até porque, o Estado já gastou muitos milhões em preservar o sistema financeiro imune à crise financeira de 2008, para que a economia não afundasse.

Apesar de ser uma actividade muito específica e das mais competitivas de Portugal, um banco não é mais do que um estabelecimento comercial. Vende dinheiro a clientes e tem lucro com isso. Mas o mais irónico nesta situação é que a banca continua a ver tudo ao contrário. A economia portuguesa precisa de crédito como se de “pão para boca” se tratasse. Mas precisa do crédito certo e responsável, nomeadamente às empresas que necessitam de alavancar o seu investimento para crescerem. Em vez desta aposta, onde poderiam aumentar a sua rentabilidade com óbvios benefícios para o país, preferem optar por um modelo tipo “selecção adversa” onde o crédito ao consumo, por ser de fácil garantia e de pequena monta, saí privilegiado, prejudicando assim as famílias, a economia e os próprios bancos

Parar de olhar para o “umbigo”

Não há noticiário que não dedique a maior parte do seu tempo à situação de crise em que nos encontramos.

Apesar deste destaque à crise portuguesa fazer todo o sentido, não posso deixar de acreditar que a maioria dos portugueses já está completamente saturada da quantidade inacreditável de novos especialistas em economia que diariamente nos entram pela televisão, dos relatos da chegada da delegação do FMI como se tratasse da cobertura noticiosa da final da Taça de Portugal e do facto de cada estatística sobre o país que é publicada ter mais interpretações do que “Hamlet” de Shakespeare.

Mas se verificarmos a gravidade da situação do país, sobretudo ao nível das suas perspectivas futuras, constatamos que esta discussão tem de ser necessariamente feita, mas com seriedade, razoabilidade e tendo a noção que muitos dos que para aí andam a comentar não são totalmente imparciais ou desinteressados sobre o assunto.

A minha declaração de interesses é clara. Quem lê os meus artigos sabe, à partida, que sou socialista e que expresso os meus pontos de vista, tendo em conta uma determinada visão ideológica da sociedade, que tento devidamente fundamentar.

O que não compreendo é que determinados comentadores, jornalistas, empresários ou banqueiros, disfarçados sobre o manto da tecnocracia, da independência da sociedade civil e da sua cátedra académica, façam determinados tipo de declarações que, pura e simplesmente, tem como objectivo servirem-se a si próprios ou satisfazer pequenos ódios pessoais.

São conhecidos alguns casos de jornalistas e comentadores da nossa praça, que, após bons serviços prestados e “desinteressados” a alguns partidos, passaram a assessores ou encabeçam listas de deputados de alguns partidos. São também conhecidos outros casos de aspirações não satisfeitas pelos partidos, que culminam em sucessivas e “pequenas vinganças” da parte destes. Como também há, negócios feitos às claras, de personalidades completamente independentes e apartidárias, que julgando-se donas de votos, regateiam altos lugares da nação com partidos políticos despudoradamente.

Mas verdadeiramente o que mais me choca é a evolução da posição do sistema financeiro português perante a realidade da crise. Hoje podemos dizer, com toda a certeza, que nunca esteve minimamente preocupada com o país, nem com as suas pessoas, estando apenas “ocupada” a salvaguardar a sua sustentação e em aumentar o seu lucro.

Se alguém possa ter algumas dúvidas sobre o que tento afirmar, constate as seguintes declarações de alguns banqueiros: Fernando Ulrich (BPI), 29 Outubro, "Entrada do FMI em Portugal representa perda de credibilidade.", 26 Janeiro, "Portugal não precisa do FMI." e a 31 Março "Por que é que Portugal não recorreu há mais tempo ao FMI?"; Santos Ferreira (BCP), 12 Janeiro, “Portugal deve evitar o FMI.", 2 Fevereiro, "Portugal deve fazer tudo para evitar recorrer ao FMI." e a 4 Abril, "Ajuda externa é urgente e deve pedir-se já."; Ricardo Salgado (BES), 25 Janeiro, "Não recomendo o FMI para Portugal.", 29 Março, "Portugal pode evitar o FMI." e a 5 Abril, "É urgente pedir apoio... já.".

Enquanto tudo isto se passa, os nossos cidadãos não conseguem verdadeiramente fazer o debate das responsabilidades desta situação, muito menos das opções e perfectivas que temos para o futuro, pois não sabem em quem acreditar.

Enquanto tudo isto se passa, os nossos parceiros europeus, de que tanto precisamos agora, olham para nós com descrença e estupefacção, chegando ao ponto de fazer declarações ofensivas ao nosso país e de dar “ralhetes” ao Presidente da República, ao Governo, partidos políticos e restantes actores sociais.

Talvez esteja na altura de todos pararmos de olhar para o nosso “umbigo” e unidos pensarmos mais no futuro de Portugal.