quinta-feira, junho 28, 2007

Gente da Chuva

Podemos não nos dar conta, mas há sempre muita gente pendurada nas janelas. Pessoas, que sem cair, são de chuva miudinha; pessoas, que sem se plantarem, são como papoilas em campos verdes, presas pelas suas raízes no bater da terra quente ou, por vezes, fria. Pessoas de A e de B; gentes em quem mora por gosto, descuido ou qualquer coisa mais profunda, um olhar parado de areia e sal, mas Pessoas, sem dúvida alguma, Pessoas que cumprem a sua função primeira: a de velar pelo mar e esperar à porta. Podemos, talvez, até, não nos aperceber, não nos dar conta, mas há Pessoas nas chaminés, Pessoas de acentos agudos e mãos circunflexas e braços que, às vezes, mais parecem tiles ou vírgulas ou até, se agitados, reticências profundíssimas, que doem na pele como tiros. Se nos distraímos, à noite, quando chegámos às nossas casas, parece já não haver ninguém nas ruas e os passeios transformam-se em sílabas ou vogais arredondadas de espanto. Sibilantes tão ciosas como sussurros, chorando a ausência de uma mãe, que, partiu como a espuma do Mar, que se esqueceu de voltar à sua areia. E mesmo, que tentemos ficar, não conseguimos; porque ainda não aprendemos a permanecer como a água que cai e não se magoa, porque é de chuva e da Gente.
Boas Leituras e até Julho.


Nota de Abertura do Suplemento de Cultura publicado hoje no Açoriano Oriental. Colaboram nesta edição: Clara Cymbron, Susana Rosa, Sofia Medeiros, Guilherme Marinho, Paulo Afonso, J.M., Tiago Tomé.

7 comentários:

Caiê disse...

"Ainda n�o aprendemos a permanecer como a �gua que cai"

confesso que esta frase me ultrapassa totalmente. � muito linda e n�o me faz sentido nenhum.

fa�o, humildemente, tr�s pontos de interroga�o.

Mariana Matos disse...

Eu penso que a água que cai permanece e que nós caímos e não permanecemos...:)

Caiê disse...

Eu creio que se a água que cai permanece nós, ao caírmos, também permanecemos (na mesma lógica de ideias) pois toda essa queda faz parte do ciclo natural das coisas, que não é mais do que transformação eterna.
Mas claro que eu não sou poeta!

Anónimo disse...

és "forte" mestre. eh eh

Caiê disse...

Bem, na verdade ainda não construí nada que desse abrigo a ninguém, em termos concretos, pelo que a força é altamente relativa. Ah ah ah!
De resto, segundo o meu irmão(zão), sou só "uma gaja que escreve umas coisas". Mai' nada.

Anónimo disse...

e já não é bom?

Anónimo disse...

gostei.