Tenho ouvido recentemente inúmeras declarações de responsáveis de empresas e instituições da construção civil, a nível regional e nacional, a exigir que os Governos aumentem ou, pelo menos, mantenham o mesmo volume de obras públicas, de forma a manter este sector em actividade e os empregos que gera assegurados.
Por muito que goste e concorde com a lógica Keynesiana de aumento de investimento público, como forma de estimular o crescimento da economia, a velha máxima “de colocar trabalhadores a abrir e fechar um buraco na estrada, para aumentar o consumo interno, gerar emprego e aumentar o rendimento”, não é aplicável em todos os contextos, muito menos em economias periféricas e dependentes do exterior como a nossa. Momentaneamente, é aceitável um esforço do Estado neste sentido, sobretudo, quando está em causa a sobrevivência da própria economia e quando há, de facto, um conjunto de infra-estruturas que são necessárias construir para um desenvolvimento sustentado. Um bom exemplo desse investimento público é a construção e reabilitação do nosso parque escolar ou a construção de acessibilidades que diminuam as nossas assimetrias.
Mas se analisarmos, concretamente, o estado da construção civil nos Açores, verificamos que existem problemas graves e complexos, em nada relacionados com o investimento público.
Durante muitos anos, este sector acreditou que poderia basear o seu crescimento à custa da construção de imóveis para residências e para espaços comerciais na periferia das cidades. Não importava o custo de construção, o volume e número de frente de obras abertas, pois o crédito era fácil e barato e a margem de venda era ainda melhor. Para a banca, interessava incentivar este tipo de negócio. Mais empréstimos a empresas e famílias, tendo como garantia um imóvel que estava sempre em valorização, era significado de mais lucros e de mais prémios de gestão no final do ano.
Para as famílias, a realização de um sonho de ter uma boa casa, através de um crédito fácil e da possibilidade de valorização deste imóvel num curto espaço de tempo, fazia que ninguém tomasse atenção aos preços verdadeiramente especulativos que se estavam a praticar.
Mas, mais grave do que estes agentes terem ignorado os sinais do que o mercado imobiliário estava prestes a rebentar, foi a ganância quase criminosa da maior parte das Câmaras Municipais açorianas, sobretudo a de Ponta Delgada. É no mínimo irresponsável, para não chamar outra coisa, permitir o gigantesco nível de construção de blocos de apartamentos na periferia de Ponta Delgada, ainda por cima com enormes obrigações para os construtores, ao nível de áreas comerciais.
Feito por defeito, calcula-se que haja mais de 1.500 habitações novas por vender no concelho de Ponta Delgada, sem falar de espaços comerciais novos vazios que são visíveis em todos os cantos do concelho. Mais incrível ainda é o facto de ninguém ter reparado que ainda há um centro comercial por inaugurar, com ainda mais espaços comerciais para arrendar.
Na prática, qualquer solução para o problema das empresas de construção civil não passa por aumentar o investimento público, até porque os preços que estas apresentam a concurso são, na maior parte das vezes, com margens perto do zero ou negativas.
Pessoalmente, considero que temos de, em primeiro lugar, resolver o problema de excesso de oferta de imóveis, estimulando a procura, através de uma baixa significativa quer dos preços de compra, quer através da melhoria das condições de acesso ao crédito de habitação. Só após a resolução deste problema base, podemos, então, iniciar um conjunto de políticas públicas, que podem passar pela reabilitação dos centros históricos e pela limitação da volumetria das construções na periferia das cidades.
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