terça-feira, junho 16, 2009

Com orgulho


Podíamos ter sido, se calhasse, outra coisa. Feitos de uma outra carne, que não doesse tanto, ter que espernear, de quando em vez, corar de esforço, regatear, mas somos isto; esta glória audaz que não exagera no tom, que não se converte em balbucios e que reage, não a metro ou por mandato, mas a impulso. Temos sido, algumas vezes, desrespeitados nos nossos quereres; muitas vezes maltratadas as nossas vontades, mas a nossa vantagem, em relação a outros, reside na forma e na circunstância como estamos. A cada golpe que levamos, resistimos. A cada afronta que enfrentamos, batalhamos e nunca, em momento algum, seremos menos por isso. Somos sempre muitos mais. Imensos, muitos, espalhados por todo o lado; imbuídos de um querer cheio; motivados pela crença na terra, acima das expectativas banais e dos caminhos da vontade para superar os espelhos da Branca de Neve.
A glória do meu Povo é esta: ser sempre a tempo o que do tempo se espera; ter deste tempo a lúcida memória do passado e ver, com olhos abertos e amiúde fiscalizados, o que não falte à alma, para sustento do coração. Seremos sempre e, muitos mais. Ampliados, além-mar, cruzando fronteiras, ultrapassando obstáculos, correndo sempre pela nossa Terra. Haverá, alguns, por certo, que enfiados em redomas de plástico, riscadas pelo passar das luvas brancas dos “cozinheiros”, ditos oficiais; se tentem esquecer dessa fibra de que somos feitos, desse enorme, cheio, mas não exagerado amor à terra; aquele “apego” de que falava Nemésio, com dupla graça, no tom com que o declamava e no modo como o empregava. Não nos rendemos ainda; não nos deixamos levar nos braços dos que, por inércia ou opção, se deixam corroer pela promessa de um novo destino, mesmo que para isso, tenham que vender a própria alma açoriana, a troco de um passe doble político, que é como quem diz: uma gincana de argumentação barata e inadequada ao tempo e aos modos. Sabemos de cor o cheiro do Inverno; as mãos a passar que não tocámos, as que vimos e não abraçámos e as outras todas que são, exactamente, o contrário disto que acima escrevi. Seremos uma nuvem em passagem, a plenitude de uma manhã enfeitada de girassóis amarelos, as formigas correndo nos carreiros apressados das ruas, a misericórdia em forma de gente. Sejamos o que formos, aqui, no Canadá, nos Estados Unidos da América, no Brasil, em qualquer uma das nove ilhas, ou qualquer outra parte do mundo, seremos sempre e mais isto. Eis pois como nos vejo: um povo intenso, imenso, incolor, um povo que de tanta transparência chega a tomar como sua, a vontade de partir e chegar sempre a qualquer outro lado, onde se veste de luz e é, em pura e plena palavra, açoriano. Sem mais nem menos. Como se fossemos de repente, a coisa que acontece por milagre.
Quem o não for, ou não quiser sê-lo, que me perdoe a impressão. Não deixando de ser só isso, não tem preço. “ (…) Pois fica-se sabendo que da espuma do mar sai gente e amor também. (…) ” (Vitorino Nemésio). E é de amor e de apego que se fala neste texto. Uma homenagem com orgulho.

14 comentários:

Filipe Franco disse...

Como pode a Assembleia Regional conviver com a ideia de que não existe oficialmente "um povo Açoreano"?

mariana disse...

Para mim existe. Um povo não se faz por catálogo. :)

Filipe Franco disse...

Chamas catálogo á Constituição?
Vou repetir, como pode existir um povo se não é reconhecido como tal?

Mariana Matos disse...

Não, não chamo catálogo à Constituição. O que digo é que o povo açoriano, para mim, existe, independentemente de ser reconhecido ou "catalogado", como tal...

TóZé disse...

Mariana com esta malta eu salto, eu pincho.
Perante a beleza da tua alma açoriana eu inclino-me.
Ser assim, como tu és, seja o que for é muito bonito. Ver e descrever o mundo através do belo da palavra é um pervilegio que eu invejo, mesmo adivinhando que às vezes, aos portadores do belo, a vida parece feia.

Filipe Franco disse...

Parece que estamos de acordo, também eu defendo a ideia de Povo Açoriano" contráriamente a parte dos nossos Deputados que tem o mesmo discurso e depois alinham com Lisboa.....enfim estão bem com Deus e o Diabo ao mesmo tempo.

Anónimo disse...

Pois eu cá não penso assim.

Povo que é povo é o Povo Português, o açoriano é apenas uma variante da espécie, e como tal apenas devérá ser protegida.

E Povo que é Raça publica tudo (inclusive os meus comentários, que até são profundos e respeitadores).

E desta vez não assino, pois não me apetece.

a tal disse...

Pois cá eu, como Açoreana, gostaria imenso de saber quem é esta espécie que aparece anónima aqui em cima.
Mais, quero aplaudir aqui a não publicação dos comentários desta espécie.
Se esta coisa realmente fez comentários e não foram publicados, algum motivo haverá para tal acontecer. E é bom que a espécie venha aqui reclamar. Ficamos todos a conhecer-nos melhor.
E, pela minha parte, com ainda mais respeito por este blog.
Parabens, Mariana ! Este texto está soberbo.
E ... " TENHO PENA DE QUEM NÃO É AÇORIANO " !

Filipe Franco disse...

E acha-se ele "profundo e respeitador"...só tenho pena que não se identifique.

Anónimo disse...

Tenho para mim que entre "A Tal" e o anonimato existem uma grande incógnita.

Entre este anónimo e a "dona" deste blog existe um entendimento democrático, embora nem sempre profícuo.

Quanto ao "Povo Açoriano", atrevo-me a dizer que mais importante será exercermos bem a nossa cidadania enquanto povo português, que todos somos.

Bolas, desde que fui à RIAC fazer o cartão de cidadão deu-me para isto.

Filipe Franco disse...

Não entendo essa do "entendimento democrático"!?

Mariana Matos disse...

Eu também não, mas "alevá"...

a tal disse...

Pois meu caro anónimo, a diferença entre mim e a sua espécie, é que a dona do blog sabe quem eu sou ... Será que sabe quem você é ? Não deve saber, dá-me a impressão que nem você mesmo sabe de si ! Há espécies assim.
E não me venha dar lições de "Portugalidade", já sou velha para isso, já vivi muito, canto o Hino Nacional há muitos anos, mas, como Portuguesa, primeiro sou Açoreana ! E você, o que é ?
P.S.: E vá aprender a escrever .... usou um tempo de verbo errado no seu comentário ! A seguir, à boa maneira Micaelense : "Vá-se catar !"

TENHO PENA DE QUEM NÃO É AÇOREANO !!! AHAHAHAHAH !

Anónimo disse...

Minha cara "a tal" li com muita atenção todos os comentários aqui publicados ( e os não publicados), e lamento, mas tenho de concluir que a senhora não só se picou, como usou palavras e expressões «de baixo nível» (citando-a) para um blog que se quer, e se pretende que continue, com os mais elevados padrões de qualidade.

Só não a mando "catar" para não descer ao seu nível.

Quanto às questões de "Quem conhece quem?", "Quem é amigo de quem?", nos blogs como na política convém sempre ter os amigos pertos e os inimigos ainda mais perto.

Cara Mariana escreva como e o que quizer,
lê quem quer e entende como quer
comenta quem não tem o que fazer,
publique o que bem entender.

A isto chama-se "Entendimento democrático".

"Alevá"