Para o Manuel Hermínio Monteiro.
" São as mais estranhas árvores, as que descem até às raízes;
pela última vez te visitam, antes que venha uma nuvem
ou que os animais te despertem a meio da noite. Estremeces
de tão pouco cuidado teres com essa maneira dos pássaros
se transformarem em fantasmas. A sombra poisa devagar
no teu ombro, como uma suspeita. Sofre-se muito: dois dias
depois lembra-se a passagem do tempo, a doçura das coisas,
como a da chuva a cair sobre os montes, a geometria
do mundo, as clareiras dos bosques, os muros das aldeias,
músicas que ouvimos antes. Teríamos sabido da morte de outra
maneira? A luz é muito diferente, nessa paisagem; escreveste-a
em silêncio, em cadernos que te chamam como uma despedida
até ao próximo Verão. Um relâmpago no céu, um rio ao fundo
da montanha: lugar tão perfeito como se de um geógrafo
se aproximassem os campos, os canais junto dos vales, as palavras
amadas. Teríamos sabido da morte de outra maneira?"
Francisco José Viegas
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