A correr, ele assobia; a saltar, rufa como um tambor e a dormir, guincha.
Depois, das férias que passou em casa das primas, regressou no Sábado de Aleluia. Veio pior que o que estava e as tias andaram, mesmo, assustadas por vê-lo, durante todo o Sábado, a percorrer os cantos da casa, como fazem os cães, de nariz rente ao chão, abanando o rabo ao ritmo de uma música estranha, que as senhoras nunca tinham ouvido. A mãe diz que é normal, que são as saudades e que ele está, apenas, a reconhecer o seu espaço. Para não se zangarem com a irmã, as tias concordam. Que remédio.
Hoje, à hora do almoço, disse às tias e à mãe que tem um sonho novo; quer ser escritor de peças de teatro. Amador porque ama a arte de escrever. Também já decidiu quais as personagens principais da obra que vai adaptar: Maria Eduarda e Simão Botelho. Egas fica de fora, porque lhe lembra a Rua Sésamo e Afonso também fica, porque Zeca Afonso há só um, o da malta e mais nenhum, diz gritando.
Os outros entram todos. E, com patrocínio da Junta de Freguesia, vai escrever e publicar, em verso, uma peça que se chamará: “Amores de Perdição dos Maias no Ramalhete”, falada em mexicano com cenários a imitar o Rio de Janeiro.
Já pôs mãos à obra e, durante toda a tarde de Sábado, as tias narraram-lhe as obras, em uníssono, para a inspiração vir, já misturada. Uma loucura.
A nosso Fífia tem restado pouco mais do que a boa vontade das tias e da mãe a vê-lo desfilar e fazer de Joaninha ou de Hermengarda; de Joane e de Brízida Vaz e a aplaudi-lo. E, como as três senhoras pareceram tão entusiasmadas, nosso Fífia já decidiu outras coisas, a respeito da peça que vai escrever e publicar com o apoio da Junta de Freguesia, que será divulgada nas rádios e televisões, com entrevistas e tudo: a peça para ser mais completa e não lhe faltar mesmo nada vai chamar-se: “Amores de Perdição dos Maias passados no Ramalhete, enquanto Hermengarda e Eurico viajam na terra e são apanhados por um dragão que vivia na barca do inferno”. Para não torná-la muito impressionante para crianças e para as suas tias e mãe, talvez, se o presidente da Junta permitir, acrescente que a barca em vez de ser do inferno, é do Noddy.
A capa do livro terá, claro, a sua cara e os braços tatuados com dedicatórias aos autores portugueses. Porém, Gil Vicente terá que ficar de fora.
O Fífia não gosta de futebol.
"E um dia os homens descobrirão que esses discos voadores estavam apenas estudando as vidas dos insectos..." Mário Quintana
domingo, março 23, 2008
Croniqueta LIII ou o Fífia tem uma certa pronúncia no andar...
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2 comentários:
Adorava ver essa peça. Já sou fã do Fífia.
Muito bom!
Ah, assim está muito melhor.
J. Morais
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