Algumas avantesmas da política nacional e regional tendem a ver discriminação, pressuponho que positiva, na decisão do Presidente do Governo Regional ao atribuir a famigerada compensação salarial a parte dos trabalhadores da administração pública nos Açores.
Não conta aqui o habitual escarcéu, da direita e da esquerda, a reclamar melhor distribuição de riqueza, a perorar 10 anos pela de perda de rendimento na função pública ou a protestar os custos da insularidade. Estas, pelos vistos, eram outras discriminações…
Como não se trata de partidarismo, mas sim de açorianidade, neste contexto entra em conta a História e a Autonomia destas ilhas, se bem que a dois mil quilómetros de distância sempre foi difícil ver um boi das duas coisas. Quando muito, lá do aconchego do Terreiro do Paço, viam os cascos do animal e entendiam logo a parte pelo todo.
Da História somos centenários credores pelo sangue que nos sugaram enquanto escravos de serviço aos celeiros do reino, que fazendo cruzes à boca abarrotavamos de cereais os porões das naus do império;
Somos credores do ouro, das pedras preciosas e das especiarias que atulhavam de proventos os cofres de um poder ostensivo e distante, sem qualquer investimento nestas ilhas.
Somos credores dos senhores dos donatários pelas barbaridades aqui cometidas, das quais o suserano guardava apenas para si a decisão sobre a pena de morte e do “talhamento de membros”. Mesmo assim houve quem ficasse sem orelhas, sem dedos ou mesmo sem mãos a aguardar resposta dos sempre ignorados pedidos de justiça à Coroa distante.
Somos credores dos cegos e cruéis impostos lançados durante séculos sobre o nosso trabalho e as nossas exportações.
Somos credores das obras públicas feitas por mãos açorianas e pagas com o nosso suor.
Fomos solidários, sempre e sempre, nos contingentes para a morte nas guerras “santas” dos impérios da Monarquia e da República.
Da Autonomia clamamos por ela mesmo antes de 1895. Queríamos apenas ser Portugal aqui, nos mesmos direitos, liberdades e garantias, já que portugueses sempre o fomos e de modo exemplar.
Não reclamamos dos Jerónimos, do Centro Cultural de Belém, da ponte Vasco da Gama, do Metro, da EXPO 98 nem sequer do possível TGV. Contra a obsessão centralista ambicionamos tão só justiça numa administração regional, porque conhecedora da nossa realidade insular e porque vivendo de perto com ilhéus que até há pouco não conheciam os açorianos de outras ilhas.
Queremos a Autonomia pela melhor condução dos nossos destinos, pela resolução dos nossos problemas, pelo direito e igualdade de tratamento na Saúde, na Educação, no Desenvolvimento e no Progresso. A tudo isso edurante séculos nos reponderam com indiferença e verdadeira discriminação.
Agora e apesar desta insolúvel dívida, aqueles que nunca viram Portugal nos Açores acusam-nos, uns de traição à Pátria e outros de eleitoralismo, pelo simples facto de gerirmos melhor do que eles e com mais justiça o nosso próprio orçamento.
Nós, que até já os descriminamos, vemos que essas avantesmas ainda insistem nas discriminações.
4 comentários:
Magistralmente escrito e um deleite para o leitor tão carecido de qualidade literária que cada vez mais escasseia na nossa praça.
Contudo, não creio que esta seja uma causa da Açorianidade !!! Não sendo uma avantesma, nem sendo menos Açoriano do que Vexa, não partilho desta inflamada defesa do subsídio de compensação tal como está e se tiver a indulgência de ler a minha crónica saberá porquê.
Saudações Açorianas...Sempre
JNAS
Caro JNAS, embora com diferentes pontos de vista, não é certamente com indulgência que leio as suas crónicas.É com todo prazer.
Abraço
H.Galante
Estimado Hermenegildo Galante aí está :
http://ilhas.blogspot.com/2010/12/via-da-demagogia.html
Saudações Açorianas,
JNAS
A tudo isso acrescente-se:
- são esses trabalhadores (discriminados positivamente) uma das rodas da economia regional.
Gerimos melhor, disso não tenhamos qualquer dúvida.
Se na Região autónoma dos Açores é possível não penalizar os funcionários públicos (dos 1500€ aos 2000€) interrogo-me porque será que no restante território nacional isso não é possível?
Pois, sabemos gerir melhor.
Não digo que a cobertura do campo de São Miguel não fosse importante, mas há que saber aferir as necessidades prioritárias e relevantes para a nossa economia regional.
É preciso saber gerir o erário público em tempo de crise (se bem que eu não me lembro de algum tempo, nesta minha vida, em que não se falasse de crise, umas vezes mais acerrimamente, outras vezes de forma indelével).
Facto é que o PIB regional, desde o início da governação de Carlos César, cresceu de forma exemplar.
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