quinta-feira, abril 05, 2007

Eu nunca li Lobo Antunes

A primeira vez que o vi foi em Maio de 2001 na feira do livro em Lisboa, debaixo de um guarda-sol, com um café aquecido pelo bafo quente do sol, que cobria todo o parque na sua extensão de barracas amarelas e anúncios de lançamentos. Distraído, pela sua função de dar autógrafos, o meu escritor preferido, sorria com os olhos à passagem das Madalenas ou dos Henriques que, pelo meio de palavras de amparo e carinho, lhe ditavam sugestões para a dedicatória. Eu nunca li Lobo Antunes. Apanhei os livros dele como uma doença: “(…) a única forma de abordar os meus romances é apanhá-los do mesmo modo que se apanha uma doença”, "receitou" o escritor, que hoje é Prémio Camões 2007, quando eu andava na Faculdade e me obrigavam a saber de cor toda a história literária dos séculos XIV e XVI. Porém, felizmente, António Lobo Antunes salvou-me da Joaninha e do Eurico, tirou-me a angústia da Menina e Moça e levou-me para outra viagem dos Descobrimentos (em As Naus). “Li” todos os seus livros de seguida; seguindo uma ordem cronológica. Papagaios de corda, garrafas de vidro azul para decorar com pedrinhas de vidro, naperons brancos dobrados nos sofás das janelas dos apartamentos de Lisboa que, então, me eram tão estranhos, como as velhinhas que via sair da missa ao Domingo, abrigadas em mantos pretos. António Lobo Antunes trouxe-me as ruas de Lisboa, pessoas sentadas, outras em passo de passeio, golpeando dores e ausências. Pessoas de olhos multados. Pessoas com gente dentro. Real. Muito real. Com ele conheci as Adozindas e os Raimundos, que ao Domingo, enfiados nos ténis da feira, mergulhavam dentro das grandes superfícies comerciais. Verdadeiro pintor, quase perfeito, foi com ele, com o António Lobo Antunes, que suspira nas entrevistas e fala como quem chora, que eu aprendi a verdadeira linguagem da literatura. Os seus livros de Crónicas, que já são três, e todos os romances como “Explicação dos Pássaros”, “Memória de Elefante” ou “Os Cus de Judas” merecem de todos nós uma doença prolongada. É então por isso, pelo menos agora que foi premiado, que sugiro aos leitores deste meu espaço, que “adoeçam” com António Lobo Antunes. E comecem pela “Memória de Elefante”, que foi o primeiro romance deste escritor, lançado em 1979. António Lobo Antunes nasceu em Lisboa, em 1942. Licenciou-se em Medicina, mas não exerce, actualmente. A semana passada, ganhou o Prémio Camões 2007, o mais importante galardão literário da língua portuguesa, no valor de 100 mil euros.

Publicado a 4 de Abril no jornal Correio do Norte

3 comentários:

gm disse...

:)

Anónimo disse...

Nunca "leste" Lobo Antunes, de facto. :)

Anónimo disse...

Gostei imenso do seu artigo. Sou responsável por um site dedicado ao escritor - www.ala.nletras.com - e estou interessado em citar este seu artigo em espaço próprio no mesmo site, com a devida referência à autoria e fonte. Se não concordar com a publicação do artigo no site, por favor escreva para alawebpage@gmail.com

Obrigado.