"(...)"Simplificar" Fernando Pessoa, tomando de empréstimo alguma da sua linguagem, e reduzi-lo ao voto de um Barco para o Barreiro, é coisa em que cada um só deve cair uma vez. Fique pela parte que me toca, o molde da queda e o valor da experiência: as pessoas sabidas descobrirão depressa onde é que está o logro e onde pode anichar-se a autenticidade. As outras, não sabidas (entusiastas, estas!) servem-me o apetite de dizer para já alguma coisa que o poema não diz:
Que Fernando Pessoa é um grande poeta. Viajou sempre em primeira classe, mesmo quando estava parado.
Só as pessoas que não viajam ganham ódio às classes que o comboio tem. Quem alcança viajar, mesmo só em terceira, vai sempre radiante. Não anda lá a prender-se com essas coisas.
As pessoas que não viajam têm as suas qualidades, são como os chefes de estação: bondosos, diligentes, aplicados. Mas não viajam, pronto. Para que nos querem convencer que viajam?
Assim como a Poesia não é para um par de sapatos, assim Fernando Pessoa não é para todos os dias. Não consta, porém, que Pessoa haja querido monopolizar os dias. Se déssemos a Pessoa os dias que ele tem, faríamos como ele - e até podíamos, como ele, ser grandes, com muitos dias para ele e para muitos de nós, seus iguais num desastre.
Que não convém nomear."
Mário Cesariny
excerto de Fernando Pessoa, in as mãos na água, a cabeça no mar, lisboa,Assírio & Alvim, 2ª edição, 1985, pp. 23-24.
4 comentários:
"A poesia foi um fogo muito grande que ardeu.
Depois ficaram as cinzas.
Náo sou capaz de dizer versos porque sim.
Acabou."
Até outro instante...
Razão tinha Rolo Duarte, hoje na Antena 1, ao referir que nenhum blogue tinha acrescentado nada à obra de Cesariny, na sua morte.
Desculpará este desabafo, mas não devemos homenagear os "artistas" só depois de mortos, como é costume neste país. Enquanto vivos, sim, divulgue-se e sugira-se a obra que nos parecer disso merecedora.
Isto não é uma homenagem. É uma recomendação de leitura. Mais a mais, neste, como noutros blogues, esta não é uma excepção. Há muito tempo, que Cesariny é aqui e noutros blogues citado, comentado e descrito. É um dos maiores poetas portugueses do século XX. E sobre ele, isto e outras coisas, já se disseram em muito lugares da "blogolândia". Não tem razão, na minha opinião, Rolo Duarte.
ó tristeza! E levantamos o dedo na crítica da agilidade.
Mariana, bem recomendado!
Sempre. Por acaso, fez parte das leituras recentes.
Beijo!
Ha! Recomenda sempre
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