segunda-feira, abril 03, 2006

Croniqueta XVII ou modus fifendi ou então gravatas há muitas, oh Fífão



Andam desatinados, os nossos Fífias com a chegada da Primavera. Não sabem se hão-de comprar um descapotável; se por outra, hão-de investir em roupa nova para parecerem mais moços e menos velhos. Não são propriamente homens novos/idosos. Pelo contrário, estão gastos; cabelos ralos e olheiras. Para não falar nas rugas, que quais cachoeiras lhes caiem olhos abaixo como escorregas de crianças, amolgados pela dureza do sol. Fífias cheios de fífalhadas, exercendo o maior poder quando fífando aqui e acolá conjugam o verbo Fífer, cujo gerúndio progride fífando lentamente como se não fífessem sem fífar.
Os Fífões, essa espécie em nascimento bruto, cavalgante, dando à costa como navios de descobridores, cheios de si, como almofadas de pena de pato. Os Fífões, essa raça, de loiros e gordos e magros e altos e baixos, mereciam ter um Sindicato. Armados de livrarias debaixo do braço, cada sovaco uma prateleira; cada passo um verso de poesia moderna; desastrados como um jogo de ping-pong; armados em frutos silvestres, rareando na torcida do vime da cesta, que os guarda, quais peças preciosas do jogo de xadrez. Os Fífões, esses gnomos do saber; apregoando-se clientes fieis das lojas do Parque Atlântico, da Modalfa, da Belarte ou da Sapataria Rosa.
Os Fífões cuja gravata fífada assume papel distinto nas “encomendas” que, em discurso, nos deixam boquiabertos com tamanha asneirada saída de uma boca só. Paciência. Mesmo assim, gosto de os ver de asas esbatidas arrumadas nos casacos a dizer Gant. Gosto de os ver de bicos caídos à espera do beijo doce da loira que avança desde a porta da rua, num vestido vermelho sangue, apertando nos quadris; gosto de os ver cheios de ramelas, quando acordados de um sono profundo de anos, esbracejando, pelo passar do tempo, em que, por descuido, fraqueza ou, pura e simplesmente, burrice deixaram correr os dias dos calendários, sentando-se como espectadores, enquanto se pintavam quadros noutras mãos e com outros pincéis. Gosto de os ver armados em “críticos de arte” muito lavados e engomados; como se tivessem sido passados a ferro; com ar reciclado e emproado; cheirando a bons perfumes, vestindo boas camisas, mas dizendo sempre as mesmas asneiras. Gosto. Gosto de os ver comendo gelados em baldes, a novidade do fim-de-semana, com as mulheres gordas e os filhos, quais bichinhos de aquário, parasitas de peixe graúdo, esquecido por detrás das rochas no tempo da frota azul. Gosto de os ver todos juntos. Apetece pegar num camaroeiro e apanhá-los a todos para deitar aos gatos que, inexplicavelmente, andam esfomeados. Mas não se pode. Respeitá-los. Sempre. Enquanto, os Fífões arrotam postas de pescada; tecem categorias disto e daquilo como se a vida fosse como os postais que, no Natal, sentados nos seus sofás de veludo ditam à mulher obediente; os Fífões não vivem, subsistem. Sempre nervosos, preocupados com a armação dos óculos, de cuja segurança depende a vista maior ou menor do acontecimento; afagados por mãos alheias, cujas obras de festim e relíquia, as maiores e melhores do lugar, lhes ofuscam as vistas. Os Fífões, essa espécie, que anda em bando; vestindo camisas caras compradas nas feiras, de cada vez que alguém vai a Lisboa e traz a encomenda das calças para os pequenos, o top para a mulher e a camisa para o emprego; de preferência de tons amarelos para condizer com as calças bege e as gravatas fífadas, cuja largura, se estivermos atentos, vemos ser bem diferente das dos demais. Assistem aos fados, às danças espanholas da companhia “y” de copo de sumo na mão e guardanapo para limpar a baba sempre que ela fala; os Fífões vão aos bailes de sapatos apertados e calças descosidas nas algibeiras, à espera de que o flash os apanhe numa atitude aparentemente desprevenida, apertando a barriga da mulher para dentro a ver se ela fica mais pequena.
Os Fífões fífiamente descansados; de narizes amolgados nas vitrines do comércio tradicional mostram os dentes aos comerciantes; mas fogem quando eles vêm à porta. Almoçam nos restaurantes das cidades e das vilas gabando as mesas vazias, desculpando-as com o ar puro. Os Fífões não pedem desculpa, quando dão um encontrão na menina ou no menino que perde o balão; porque os Fífões são mais que os Fífias. São Fífões. E, por cada degrau, que sobem tornam-se mais flutuantes. E Fífam-se antes que ela lhes puxe as orelhas. Saem em bando nos seus casacos tirylenne e as suas camisas de tom amarelado; porque a Primavera lhes dá o toque de passarinhos que, no fundo gostavam de ser, para, todas as manhãs lhe cantarem à janela, a serenata da Primavera….como se o mundo fosse só dela.

2 comentários:

Terceirense disse...

Olá. Há muito que não comentava o teu blog. Hoje vim aqui de propósito porque vou chegar por aí. Espero que esteja bom tempo. :) Se der tempo de responderes pode ser para o e-mail da vodafone
Abraço

Anónimo disse...

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