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"Esse olho apresenta uma unicidade total com todas as nervuras nocturnas: sob a luz das estrelas, nunca serei uma delas, só tu és o meu olho inominável. Dar-te um nome é instituir a ordem da representação, nunca ressuscitarias de mim para me perdoares. És a fracção menor de um bicho que não chegou a tempo de se descriar, desnascido num voo inteiro, antes dos retratos repulsivos das coisas orgânicas. Não serás apenas uma consciência reflexiva de mim? Incansável, sem nome próprio, descubro-te na subtracção da última diferença, inatingível ao pronome eu. De nada me vale ser um sujeito de percepção objectiva atento a todos os fenómenos do teu desenvolvimento. Tu és um olho à solta metamorfoseado numa célula como uma apóstrofe."
António Ramos Rosa e Isabel Aguiar Barcelos, Bichos Instantâneos, Edições Quasi, Lisboa, 2005, pp.64.
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