"E um dia os homens descobrirão que esses discos voadores estavam apenas estudando as vidas dos insectos..." Mário Quintana
sábado, julho 31, 2010
quarta-feira, julho 28, 2010
terça-feira, julho 27, 2010
Os corações também se gastam
Hermenêutica é uma ciência que estuda a compreensão humana e a interpretação de textos escritos. O vocábulo deriva da palavra grega: “Hermes”, que entre outros significados é a quem (porque é um deus), os gregos atribuíam a origem da linguagem e da escrita.
Podemos tranquilamente ser bem sucedidos numa interpretação de texto. Para isso devemos ter em conta várias condicionantes, que passam naturalmente, por ler todo o texto (tenha ele 10 linhas, menos ou mais); procurar num dicionário as palavras desconhecidas, ler o texto três ou mais vezes, voltar ao texto tantas vezes quanto for preciso, perceber as ideias.
A má interpretação de um texto, esquecendo, por exemplo, os sujeitos ou complementos directos, pode levar a erros graves que prejudicam o entendimento, quer solitário, quer colectivo, quando ele é, por exemplo, partilhado numa crónica ou numa qualquer notícia de jornal.
Figuras de Estilo. A lista de figuras de estilo é imensa para se escrever em português – seja notícias, crónicas, croniquetas, poemas ou romances. Há a metáfora, a aliteração, o pleonasmo ou a hipérbole, por exemplo, além é, claro, da “famosa” metonímia…que muitos julgamentos prévios pode provocar.
Ora, através desta figura de estilo designa-se uma entidade implícita através de outra explícita. Exemplificando, se aquilo que se lê é: “ O Governo Regional vai iniciar uma série de reuniões com as Câmaras Municipais das ilhas de S. Miguel, Terceira e Faial” não vale a pena fazer logo uma série de extrapolações.
Afinal a ilha de São Miguel tem, como se sabe, seis autarquias: Nordeste, Povoação, Vila Franca, Lagoa, Ribeira Grande e Ponta Delgada; a Terceira tem duas: Angra do Heroísmo e Praia da Vitória e o Faial tem uma: Horta. Para quê inventar, então? E logo interpretar, por exemplo, que o Governo vai reunir com umas e não vai reunir com outras? Que vai à Vila, mas não vai a Ponta Delgada, que vai à Horta, mas não vai ao Nordeste? Das duas uma ou é má fé ou é distracção. Aposto mais na segunda hipótese. É da (minha) fé…
Niemeyer. E, por falar em fé e fazendo-a: li uma notícia divulgada a semana passada no jornal Público, que dava conta da visita de Niemeyer a Espanha para a inauguração do Centro Cultural de Avilés, nas Astúrias. A fazer ainda (mais) fé na mesma fonte que admitia que a seguir, o arquitecto virá a Lisboa para aferir se há interesse em retomar o projecto concebido em 1999 para dar corpo à sede da Fundação Luso-Brasileira, é caso para se perguntar porque é que não se fala dos Açores na notícia? (sim, Açores, com Ponta Delgada, incluída).
Hipérbole minha ou tudo isto não passa de uma grandiosa e gigante Analepse? O título da notícia sobre o assunto é: “Niemeyer pode vir a Lisboa terminar único projecto em Portugal, parado desde 1999” e saiu no mencionado jornal, a 23 de Julho do corrente.
Jorge Nascimento Cabral. A notícia do falecimento de Jorge Nascimento Cabral apanhou-me perfeitamente desprevenida. Não estava à espera de o ver desaparecer tão cedo do nosso “convívio”, de entre o povo açoriano…
Porém, a vida tem-me ensinado ao longo destes anos, e das partidas que me tem pregado, que às vezes a justiça não se faz, com a verdade que esperamos receber. Na RDP/Açores, na manhã de sexta-feira, ouvi o jornalista Sidónio Bettencourt, dizer de Jorge Nascimento Cabral (citando Paulo Martinho) que foi pessoa que “nunca viveu em paz sujeito”. Nada o define melhor, permito-me dizer, com a certeza do que pude apreciar ao longo do nosso tempo comum.
Leitura de férias. De Pedro Paixão. “Os corações também se gastam”. Um livro de contos sobre a vida em geral e os sonhos em particular. Muito pouco, ou mesmo nada pretensioso, como são na sua maioria, os livros deste autor. Capa em cartolina prateada, simulando um espelho, onde foi escrita a baton, a frase que dá título ao livro e, por empréstimo, à minha crónica de hoje.
É, porém certo e avisado, que sem ironia, esta frase aqui se usa, apenas e só, como uma metáfora. E por agora despeço-me fazendo votos para que os corações gastos se renovem nos banhos de mar, já que para os agastados não parece haver solução.
Até mais logo. Boas férias.
segunda-feira, julho 26, 2010
E Agora!?
Quando me debrucei, há alguns anos, a estudar a “Grande Depressão” de 1929 senti-me fascinado pelo facto daquele período ter originado toda uma nova concepção de modelo de desenvolvimento económico, que nos levou ao maior período de prosperidade da humanidade. Nos quinze anos seguintes a 1929, o Estado passou de um mero observador, responsável apenas pelos sectores da Defesa, Justiça, Administração Interna e de regulador incipiente da actividade económica, a um regulador presente, detentor de empresas estratégicas para a economia, orientador e motor do investimento nos países e garante de um sistema de protecção social que promovia a igualdade entre os cidadãos.
Este “New Deal” promovido pelo presidente americano F. Roosevelt e desenvolvido praticamente por todos os seus sucessores até Reagan, espalhou-se por todo o mundo ocidental, tendo originado, segundo Paul Krugman, “a maior redução de desigualdades sociais da história da humanidade”.
Todas estas conquistas civilizacionais foram, progressivamente, destruídas a partir dos consulados de Reagan e Thatcher, que preconizavam a saída progressiva do Estado na economia, nomeadamente, com a privatização de empresas públicas em áreas estratégicas, como a da banca, dos transportes e da energia, com a progressiva privatização do sector da saúde e dos sistemas nacionais de pensões e a desregularão dos sistemas financeiros. Com a queda do bloco comunista, todas estas pretensões mais “liberais”, ganharam ainda mais força, resultando em mais instrumentos financeiros de reputação duvidosa, mas muito lucrativos, na proliferação de paraísos fiscais onde as grandes empresas escondiam os seus lucros, deixando os seus prejuízos nos seus países de origem.
Não foi estranho que, contra todas as previsões, dos protagonistas deste mesmo sistema, em 2008, a economia tenha pura e simplesmente “rebentado” e originado a “Grande Recessão” dos últimos 80 anos.
Mas mesmo assim, quando todos pensaram, que podíamos resolver esta crise aplicando parte da receita utilizada em vinte e nove, a maior parte dos países afectados, optaram pelo caminho mais fácil e menos doloroso: atiraram dinheiro para economia para estimular a actividade económica.
Um erro fatal, na minha opinião. Aumentar o investimento público, sem reformar o sistema financeiro mundial, sem regular o mercado imobiliário e sem cortar no desperdício é como aplicar uma aspirina para curar uma pneumonia. O doente pode sentir-se melhor no início, mas, como não lhe foi dado o tratamento adequado, pode eventualmente morrer.
O sistema financeiro continua instável, o mercado imobiliário ainda não percebeu que o seu ciclo de ouro terminou e a economia mundial timidamente recupera, podendo a qualquer momento colapsar de novo. Se entrarmos na segunda recaída da crise em W, tudo será pior. Os Estados estão falidos e endividados e não poderão retomar o investimento público, nem sustentar as prestações sociais, as empresas não aguentarão uma nova quebra no consumo e as famílias não aguentarão com o flagelo do desemprego e dos juros altos dos seus empréstimos.
Qual a solução para esta situação de possível emergência social? Deveremos reduzir a intervenção do Estado na economia, flexibilizar os despedimentos, diminuir as prestações sociais, privatizar a saúde e educação e reduzir impostos, por forma a que as contas públicas fiquem mais folgadas e os privados tenham mais dinheiro para investir?
Na minha opinião, não!
Foi a tentativa de impor este modelo económico/social que nos levou até esta situação. Devemos sim, rapidamente impor um novo sistema regulador do sistema económico e financeiro europeu, à semelhança do que aconteceu nos EUA, impor limites claros ao mercado imobiliário e começar a cortar assertivamente nos desperdícios das contas públicas do nosso país. Quem preconiza cortes nos salários de 20%, como forma de melhorarmos as contas públicas, geralmente ganha acima dos 5000 euros e não sabe o que é viver com menos de 500 euros por mês.
Se somarmos os prejuízos acumulados da CP, da TAP, da REFER, dos ENVC, da RTP, chegamos a um valor provavelmente superior a 5 ou seis TGV´s e à solução para o défice. Para melhorar as nossas contas públicas, não é preciso atingir ninguém, basta gerir melhor.
terça-feira, julho 20, 2010
Não foi por falta de aviso…
Em primeiro lugar, é importante destacar que esta comissão terminou os seus trabalhos dentro do prazo de seis meses estabelecido, tendo em conta o grande caudal de documentos para análise, as várias audições efectuadas e a elaboração e votação do relatório final dos trabalhos.
Porque uma comissão de inquérito não é um expediente normal, importa, por isso, tecer algumas considerações na perspectiva de quem acompanhou este processo.
Retenho uma ideia-chave do final dos trabalhos: o PSD entrou para esta comissão com a ideia fixa de fazer um julgamento sumário do Governo Regional e saiu, no final da comissão, sozinho e agarrado a uma expressão solta de um relatório de uma das partes interessadas neste processo. Mais nada.
Assistiu-se a um PSD isolado nas votações, estranho na relação com os outros partidos presentes na Comissão de Inquérito e sempre sobrepondo a sua estratégia partidária ao interesse comum do bom funcionamento dos trabalhos. Aliás, ficou a ideia generalizada de que o PSD utilizou esta comissão de inquérito como se de um comício partidário se tratasse.
Uma comissão de inquérito, quando está em pleno funcionamento, não é compatível com ameaças de recurso a instâncias judiciais, com quebras de acordos aprovados por unanimidade e pela falta de lealdade institucional. Tudo isto mostra bem o espírito com que o PSD encarou este processo.
No final disto tudo, é legítimo pensar-se que o PSD, apenas e só, trabalhou para o “soundbyte” do final do dia. É pouco, muito pouco, para quem, nos últimos anos, assentou toda uma estratégia política nos transportes marítimos de passageiros e acabou isolado, repetitivo e acossado.
O PSD está a sentir a síndroma do apostador que se apercebe que esteve, repetidamente, a apostar no cavalo errado. Está a experimentar um sentimento de vazio. Não foi por falta de aviso.
Com o sol de Verão (finalmente) à porta e as férias a passar ou a chegar há mais tempo para ler. Por isso e para não variar deixo aqui uma sugestão de leitura de férias. Esta semana escolhi de Herta Müller: “ Tudo o que eu tenho trago comigo”, numa edição da Dom Quixote.
Trata-se de uma obra passada no fim da Guerra, na Polónia, em 1945. A história foi escrita a partir de conversas que a escritora manteve com sobreviventes dos campos de trabalho.
A crítica literária internacional tem dito que a escrita de Herta Müller se distancia e muito da “plantinha mimada” a que nos habituou grande parte da literatura alemã contemporânea. Não deixa de ser porém mais uma forma de narrar este capítulo da história mundial.
Termino com uma das melhores frases de António Lobo Antunes, que nos recomenda que: “Devemos fazer tudo o mais simplesmente possível mas não mais simplesmente do que isso.” (título de uma crónica da Revista Visão. Publicada em Novembro de 2009).
No final, não será por falta de aviso…também.
sábado, julho 17, 2010
terça-feira, julho 13, 2010
Só o PSD é que marcha direito!?
Na passada quarta-feira, os trabalhos da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) que tinham como objectivo apurar responsabilidades políticas sobre os constrangimentos de construção dos navios Atlântida e Anticiclone, chegaram ao fim, com o PSD a votar isolado contra as conclusões que o PS, CDS/PP e o PCP aprovaram. A Comissão de Inquérito entre muitas outras conclusões a que chegou, não conseguiu aferir de qualquer responsabilidade política da parte do Governo dos Açores neste processo.
Não é uma conclusão extraordinária, pelo menos para mim, quando verificamos no decorrer dos trabalhos da CPI que os Estaleiros Navais de Viana do Castelo no acordo que fizeram com a Atlanticoline, pagam à Região mais 2,7 milhões de euros do que tinham recebido da empresa regional para construir os 2 navios, assumindo claramente as suas responsabilidades no processo.
Mas para mim, o que mais me incomodou no decorrer dos trabalhos da CPI foi a postura totalmente irresponsável do PSD, que por diversas vezes roçou o desespero. Bem sei que o maior partido da oposição e a sua líder apostou muito em obter dividendos políticos com esta CPI, tendo inclusive nomeado um dos seus melhores e mais trabalhadores Deputados, Jorge Macedo, para defender a posição do PSD, mas a meu ver, nada justificava o conjunto de atitudes que foram tomadas para obter dividendos políticos.
Facilmente o leitor poderia achar que a minhas acusações ao PSD, reflectem a minha filiação partidária, mas após conhecer os factos ocorridos durante a Comissão, facilmente percebe a minha indignação.
O PSD, conjuntamente com os restantes partidos da oposição, propôs uma CPI à construção dos Navios Anticiclone e Atlântida, que o PS prontamente anuiu. Mas contrariando o que é normal nestas situações e a vontade dos restantes intervenientes, o PSD preferiu adiar por mais dois meses o início da CPI de forma a adequar o calendário da comissão à sua agenda partidária.
No inicio dos trabalhos da CPI foi acordado por todos os partidos lá representados, só dar declarações após as audições dos inquiridos evitando assim um circo mediático após cada inquirição que desrespeitaria tanto os convidados como a credibilidade da CPI. Momentos após a reunião em que se decidiu voltar a contactar algumas personalidades a prestar testemunho na CPI o PSD prestou declarações à comunicação social, acusando as ditas personalidades de se recusarem a vir à CPI, podendo mesmo conscientemente inviabilizar os novos convites, violando claramente o acordado e provocando a indignação nos restantes membros da Comissão.
Mas mesmo assim o PSD, não se deu por satisfeito, para além de propor ouvir em comissão toda e qualquer personagem que sequer tenha olhado para os navios, ainda não iam os trabalhos a meio, já assumia conclusões sobre os resultados dos trabalhos e sobre a incompetência da comissão de que tinha sido um dos proponentes. Na prática percebemos todos desde cedo, que o PSD já tinha as suas conclusões escritas muito antes do inicio da CPI e que tudo faria para que essas é que valessem.
Após cinco inquirições que duraram mais 50 horas, outras tantas horas de trabalho e de deslocações e a análise de mais de 10000 páginas de documentação e de muito dinheiro dos contribuintes gasto, a CPI elaborou um relatório sério, com os factos provados e com as conclusões a que se conseguiu chegar. O CDS/PP e o PCP, diga-se de passagem, os únicos partidos da oposição que desde o inicio sempre tiveram uma postura responsável, de seriedade e de vontade de esclarecer tudo o que houvesse para esclarecer, votaram a favor do relatório pois concordavam genericamente com o seu conteúdo e com as suas conclusões.
Mas mesmo assim o PSD, não se conformou, pressionado pela sua líder, os Deputados do PSD, desrespeitando a Comissão de que tinham sido um dos proponentes, mesmo antes do seu término, enviaram um conjunto de documentação, que desgarrada serve os seus propósitos, para o Ministério Publico, para que no dia das conclusões da CPI tivesse um sound-byte para dar à Comunicação Social.
A postura do PSD, neste processo, faz-me lembrar a daquela mãe que vê o seu filho a marchar desalinhado com o resto dos colegas e afirma: “já viram? Só o meu filho é que está a marchar direito!”.
quarta-feira, julho 07, 2010
Roqueiras
Quem certamente não “dormiu” descansada foi a pobre da estátua de Gonçalo Velho, que depois dos laços vermelhos de um Natal passado, da Vanessa da Mata e de outros bailes e balanços há-de ter pensado que era chegada a hora do seu descanso. Mas, não. Até já montaram, em plena via, por trás das portas da cidade, um palanque cheio de bandeirinhas…
Império dos Nobres. A história do culto ao Espírito Santo no Arquipélago dos Açores, na qual estão incluídos, naturalmente, e por exemplo, os impérios da Rua do Passal, da Arquinha, da Rua João do Rego de Cima ou da Rua da Alegria, tem origem em profundas tradições culturais e religiosas.
A constatação por parte dos vereadores do PS de Ponta Delgada de que as “Grandes Festas Grandes” municipais estavam tuteladas politicamente pela autarquia, e a sugestão de que mereciam (as Festas) rever o modelo da sua gestão levou a edil deste concelho a comparar as “suas” Festas com a deliberação de 1672, que acontece, na Horta, como cumprimento de uma promessa “enquanto o mundo durar”, motivada pela ocorrência de um vulcão, naquele tempo, nas freguesias da Praia do Norte e Capelo …
Ora, a comparação com o incomparável revela algum desconforto pela apresentação de mais uma boa ideia pela oposição na autarquia.
Não vemos, porque razão não há-de a edilidade ponderar, pelo menos, discutir ou debater o modelo de organização das “Grandes Festas Grandes”? Permitindo, com isso, despolitizar a iniciativa e afirmar a tradição do culto, que deve ser (acreditamos) o que mais importa à Câmara Municipal de Ponta Delgada.
É claro que assim talvez não houvesse fogo-de-artifício e as “estrelas no céu” não se fizessem ver, mas tal como na canção, mandam as “regras da Sensatez” que se coloque a questão, pelo menos, a debate…
Leitura para as Férias. A “Alegoria do Património” de Françoise Choay. O livro propõe uma reflexão sobre o futuro das cidades, um olhar sobre as relações entre o património móvel e imóvel, para além, é claro, de discutir a transformação do entendimento do património, nos nossos dias, muitas vezes visto, como produto de consumo e espectáculo.
Vale a pena lê-lo para perceber (ou comparar) como é fácil que alguns, mesmo sem querer, banalizem a dimensão fundamental do que temos como nosso – memória de passado, de presente e de futuro – e vandalizem – a história do nosso tempo.
Só o futuro dirá como acabou essa história. Por ora, não há códigos milagrosos, nem me parece que a Rainha Santa Isabel vá reaparecer aos querubins por mais “contemporâneos” que eles possam querer ser ou parecer…
domingo, julho 04, 2010
Portugal e os Outros
Numa altura de em que a economia portuguesa atravessa dificuldades, muitos portugueses interrogam-se sobre a gravidade do assunto e a justificação para a polémica em causa. Na verdade, porém, apesar do tecnicismo envolvente, o que está em jogo tem uma inequívoca importância estratégica e interesse nacional.
A PT é uma das cinco maiores empresas portuguesas, líder nas comunicações em Portugal, e presente em países como Cabo Verde, Moçambique, Timor, Angola, Quénia, China, São Tomé e Príncipe, Namíbia e Brasil. A PT passou de uma pequena empresa europeia, a uma empresa com dimensão internacional quando, sobretudo, passou a deter 50% do capital e a gestão da maior empresa de telecomunicações móveis da América do Sul, a Vivo. Esta participação, para além de ser, provavelmente, um dos maiores investimentos portugueses no estrangeiro, proporciona, com os lucros obtidos, melhorar significativamente a nossa balança de pagamentos com o exterior.
Mas, o que me parece verdadeiramente importante é deter a gestão e a participação numa empresa com mais de 55 milhões de clientes. Isso dá a possibilidade à PT de criar economias de escala, bem como externalidades positivas para a economia portuguesa, que seriam impossíveis de reproduzir numa empresa com apenas 10 milhões de clientes. Por exemplo, seria impossível à PT, em Portugal, ter um centro de investigação e desenvolvimento com a capacidade e a dimensão do actual, empregando um tão elevado número de investigadores, se este mesmo Centro não trabalhasse para os mercados português e brasileiro. Essa participação ancora, pois, riqueza, inovação e emprego qualificado no nosso país.
Os Governos que promoveram a privatização e internacionalização da PT tiveram em atenção esse potencial estratégico, e por isso acautelaram, de forma então mais comum, a chamada Golden Share, que mais não é do que “um conjunto de acções detidas pelo Estado numa empresa (…) que lhe confere direitos particulares (…) que normalmente incidem sobre decisões de carácter estratégico para a empresa tais como fusões, aquisições ou alteração dos estatutos”. Trata-se, portanto, de um mecanismo de preservação do poder de ingerência do Estado nas decisões da empresa privatizada, cuja finalidade é a de assegurar o "superior interesse nacional”.
Aquando da aprovação, em Assembleia Geral de accionistas, da venda da Vivo à Telefónica, o Estado utilizou o seu direito de veto ao negócio em nome do, para mim, evidente e já demonstrado “interesse nacional”. Contestado porquê? - porque os accionistas privados pensam naturalmente no seu lucro e não no interesse nacional, e assim se opuseram ao veto; porque existe um processo em Tribunal de Justiça das Comunidades sobre o futuro das Golden Shares; pelo facto das correntes mais liberais serem, em qualquer caso, contra a intervenção do Estado no mercado; e, finalmente, pela Telefónica, graças à sua dimensão e poder gigantescos, influenciar facilmente governos estrangeiros e a imprensa internacional.
Proteger, neste caso, o interesse nacional é, sem dúvida, o que nos compete fazer. E não há dúvida que o Governo agiu com esse desígnio, por mais poderosos e numerosos que sejam os competidores externos. Só espero que o tenha feito considerando cuidadosamente a ordem jurídica europeia.
sexta-feira, julho 02, 2010
Podem falar
Tu vives em sociedade e tens que perceber
Que as regras são para se cumprir... não sei se tu estás a ver, pá...
Ah, ah! - disse eu - Estou a ver muito bem...
Mas já agora diz lá que culpa tenho eu
Que no teu jogo existam cartas que não fazem sentido no meu...
Podem falar, podem falar,
Que o meu lugar é andar e o meu passo é correr
De vez em quando a cantar de vez em quando a sofrer.
Podem falar, podem falar,
Mas estão a perder tempo se pensam que um dia me hão-de amarrar.
As principais capitais aprendi eu no liceu,
Vi retratos de reis em tronos de ouro e marfim,
Mas ninguém me ensinou a nadar no rio que nasce dentro de mim.
Um dia pus-me a lutar, com as minhas contradições
Estive quase a morrer, mas acabei por escapar.
Para quem ama a liberdade o importante é nunca parar
Podem falar, podem falar,
Que o meu lugar é andar e o meu passo é correr
De vez em quando a cantar de vez em quando a sofrer.
Podem falar, podem falar,
Mas estão a perder tempo se pensam que um dia me hão-de amarrar.
Já vi muita gente a tentar agradar
A todo o gajo que pensa que nasceu para mandar,
Mas tenho visto muita gente que está só, a morrer devagar,
E a distância que existe entre o não ser e o ser
É uma questão de não se ter medo de ir longe demais.
O que ainda não tem preço é sempre o que vale mais.
Podem falar, podem falar,
Que o meu lugar é andar e o meu passo é correr
De vez em quando a cantar, de vez em quando a sofrer.
Podem falar, podem falar,
Mas estão a perder tempo se pensam que um dia me hão-de amarrar."
Jorge Palma