Na semana em que o Governo da República dá a entender que vai necessitar de mais medidas de austeridade para cumprir o seu próprio orçamento, em que nove países da zona euro, entre os quais a França, Áustria e Itália, viram a seu rating baixar, apesar de todas as medidas de contenção da despesa pública, o país diverte-se a discutir e a perseguir a Maçonaria como se esta fosse responsável pelos reais problemas do país.
O Estado português vende uma participação estratégica na empresa monopolista de produção de eletricidade no nosso país e a discussão rapidamente deriva para o facto de quem compra ser chinês ou para os quatro ou cinco “tachos” que Passos Coelho arranjou para membros do seu partido.
Apesar da recente descoberta da China pela parte dos média portuguesa, fazer de Paulo Futre um “visionário” quando se referia à importância do “chinês em Portugal”, chocou-me a forma “provinciana” como toda esta situação foi encarada, sem nunca discutir se era do interesse nacional vender esta participação e sem nunca discutir se os 2,7 mil milhões de euros pagos pela empresa China Three Gorges eram verdadeiramente o preço justo da EDP. Talvez o facto do responsável pela empresa chinesa ter dito publicamente que este “negócio” estava barato para eles, ajude a reforçar a minha opinião de que o Estado vendeu os “anéis” a preço de saldo.
Às vezes a discussão vivida nos média, com grandes responsabilidades pela parte de alguns protagonistas de partidos políticos, parece desprovida de bom senso, focada no assessório, completamente alheada do que se passa nos nossos países vizinhos, na União Europeia e nos Estados Unidos.
Continuamos a afundar a nossa economia, baseados em conceitos de melhoria de um modelo de desenvolvimento neoliberal, de cada um per si, que nos levou a esta situação de “Grande Recessão”. Discutimos incessantemente ideias, infelizmente incontestadas, de como controlar as contas públicas com austeridade, de como pagar a dívida externa do Estado à custa dos seus cidadãos e de como dar confiança aos mercados para que estes nos permitam viver.
Vi apenas alguns políticos e economistas, que foram rápida e fortemente atacados pelo poder instituído e pela “ditadura do conceito”, ousarem dizer que nenhum país na sua história pagou a sua dívida externa e que as dívidas devem ser controladas e geridas a favor do crescimento económico.
Vi apenas alguns políticos e economistas, logo descredibilizados e até gozados pelos média, dizerem que nenhum país, nem a União Europeia no seu conjunto, suporta viver para satisfazer os mercados financeiros, considerando que os mesmos, tendo que existir, devem sim contribuir para a riqueza das nações.
Vi apenas alguns políticos, jornalistas e economistas, a quem foi dado pouco destaque, afirmarem que a austeridade per si, como modelo de contenção das contas públicas e de poupança implica sempre, menos bem-estar das populações e por consequência uma recessão económica, o que obriga, como já percebemos pela experiência do nosso país, a entrarmos num ciclo vicioso de austeridade.
Vi ainda alguns dos nossos mais brilhantes políticos, como Mário Soares, consciente como poucos, da nossa situação, assumirem com frontalidade, que a maior parte da soluções para os nossos problemas, não decorrem da nossa ação direta nas políticas públicas de cada país, mas sim no aprofundamento da União Europeia no sentido de arranjar soluções efetivas e globais para problemas que são globais.
São estas ideias, por muito que as considerem certas ou erradas, que devem estar no centro da discussão e das atenções da sociedade portuguesa. Temos de parar de discutir o detalhe, a politiquice e os fait-divers que não nos levam a lado nenhum. Por mais que não seja, porque todas as ideias incontestadas que tivemos sobre esta matéria, até hoje, têm os resultados devastadores que conhecemos.
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